Yesterday

De repente uma saudade beatnik

me invadiu de blue jeans

a cantar Yesterday...

E o radinho da memória

sintoniza Janis Joplin

pra que eu lembre Summertime

e exorcize a nostalgia

me dopando com gin tônica.

Ah, por que gastei meus tênis

caminhando sem destino

com a esperança na mochila

se a estrada que me trouxe

não passou pelo teu bairro?

Era um garoto que amava

os Beatles e os Rolling Stones,

com o mapa mundi na cabeça

e uma caneta na mão

teorizando sobre a paz entre os povos

como se todos os caminhos da humanidade

pudessem ser timbrados em decassílabos,

como se as latitudes do planeta

fossem seis veias sonoras

pulsando no braço da guitarra.

Ah, utopia da comunidade universal!

Neruda no Pacífico

fazendo guerrilha com a poesia,

Jimi Hendrix em Woodstock

vazando a alma pelos dedos

até morrer de falso céu...

E eu, ao sul do sul, me matando de viver

em trinta e seis rotações

os meus sonhos de vinil.

Por que ficaste na janela

vendo o tempo passar de trem,

se eu te esperava na estação

cantando Help e escrevendo madrigais

em dó maior?

Por que te envolveste tanto

com violetas e enxovais

se tudo que precisávamos

era da rosa-dos-ventos

e um velho jeans surrado?

A juventude passou, de trem, por nós.

Tu ficaste na janela

com medo do horizonte...

Eu descobri que a realidade,

seguindo de tênis pela estrada,

foi meu sonho mais bonito.

Yesterday... Yesterday..