O INFINITO

A minha mão escreve sobre buracos negros

a tinta branca do mel estelar

o poema sem fim. Levo-o comigo nas asas

de uma nave inventada por mim e reparo

que ela brilha como os teus olhos verdes

no contraste com as constelações distantes.

Erro, pelo espaço da palavra, sem protecção

nem rota, ao nível das ondas hertzianas e aceno

aos azimutes sempre que sou perseguido

pelas prolíferas tempestades cósmicas e vejo-te

andando sobre planetas desconhecidos. Eu sei

como ir. Mas, se for, renuncio ao regresso

porque conduzo o meu destino nos dedos

com que apontas para o fundo das distâncias.

Quando lá chegar, entre o chão borbulhante

da estratosfera e os teus lábios, saberei

escolher. A festa, para ti, será feita sempre de dia,

sob os raios de sol dos teus cabelos de ninfa,

onde possa adormecer. Aí, no infinito de tudo,

onde possa adocicar o amargo dos teus beijos

e os males das injustiças, com uma luz de braseiro,

suficiente para iluminar as maçãs maduras

do teu rosto. Quando acontecer o contrário

verei que chegou a hora de conversar, de ceder,

às apetências dos deuses e sentar-me-ei,

num satélite de Agosto, para poderes ficar ao meu lado.

Se voltar à terra, acredita, será por não aguentar

sobre o corpo, o peso do universo, a ladaínha divina

que te ensinaram a decorar desde pequenina.

Posso então, finalmente, deixar-me morrer,

no espaço sideral. Celestialmente recompensado.

aí, como notarás, terei as musas todas, as fontes

de inspiração dos poetas, aplaudindo o gesto.

Por ora, tentemos ser felizes. Não importa o resto.

José António Gonçalves

(9.2.05)

http://members.netmadeira.com/jagoncalves/

JAG
Enviado por JAG em 10/07/2005
Código do texto: T32704