LÁGRIMAS DE OSSO & MAIS
LÁGRIMAS DE OSSO I (9 AGO 11)
Desce o destino feito uma chibata
e não se importa aonde o golpe caia,
desde que cause algum tipo de ferida.
Assim é a vida. Se temos o timão
firme nos dedos, podemos em verdade
controlar nosso curso. A tempestade,
chega, porém, sob os sinos do trovão.
De más escolhas feitas, conclusão,
de aceitações no instante da vaidade,
de conclusões em pura veleidade,
má consequência tão só de uma paixão.
Porém a vida que a procela me arrebata,
só salvarei, se da armadilha saia,
pelo denodo de minhalma revestida.
LÁGRIMAS DE OSSO II
Palavras que consolam. Penso ainda
conseguir meu próprio barco dominar,
cortar o vento da tempestade infinda.
E o ardor para enfrentar, assim me brinda
meu pobre coração a se afoguear,
sei muito bem o que tenho de esmagar
e achar que posso é uma ilusão tão linda...
Mas cedo ou tarde a vida ainda me esmaga
e se algum dia chegar a triunfar,
na maré baixa na praia ir ancorar,
(que o coração é forte e a carne estraga),
provavelmente será tarde demais,
que embora a alma não se vá resignar,
talvez o barco afunde antes do cais!
LÁGRIMAS DE OSSO III
Mas sempre insisto, por baixo seja o ganho,
por triste a sorte que meu peito marca,
fraca a colheita após um longo amanho.
Porém prossigo até me dessangrar,
desgastando minhas reservas de energia
(e nem sei bem de onde ela existia!)
que até o presente pude renovar.
Mas certamente, em meu supersticiar,
acredito no poder da invejaria,
na raiva surda que por mim sentia
toda essa gente que me busca depreciar.
Mas sou a mescla do mais puro estanho
com o cobre puro que a razão abarca,
a revestir-me de bronze em cada lanho.
LÁGRIMAS DE OSSO IV
E isso, minha querida, te desejo:
que tenhas forte o coração de aço,
porém macio à luz de cada beijo.
Que saibas teu destino confrontar,
com mansidão e singular pureza;
que teus dedos manipulem a incerteza,
com a calda que provém de teu olhar.
E que tua vida consigas controlar,
na expectativa da pura fortaleza,
na calmaria da maior firmeza,
sem que te tornes incapaz de amar.
E que transformes cada mau ensejo
na calidez mais terna desse abraço
que sempre que te avisto, mais almejo.
AUDÁCIA I (2008)
"Audacia sua nautae patriam salvaverunt
ac poeta nautarum victoriam laudavit."
-- Valente
Se sabes teu valor, insiste agora!
Quem desiste do amor perde sua hora
Quem teme o próprio odor vê ir-se embora
Quanto reuniu com dor no seu outrora.
Se sabes o que queres, faz e luta;
se temes o que esperes, sempre escuta
na vida teus lazeres: sorte bruta!
atrasam teus misteres: tua conduta.
Portanto, não te leve a depressão;
somente a raiva inscreve ao coração;
quem vencer sempre deve a opressão,
aceitar nunca teve qualquer escravidão.
AUDÁCIA II (10 ago 11)
Mas quem rege tua vida é dom traiçoeiro:
levar-te-á de vencida bem ligeiro;
na luta mais renhida é cavaleiro,
para cortar tua lida bem certeiro.
Portanto, te precata e te previne:
a morte não tem data em que se fine;
o fado não acata que destine
a flecha que te abata e te assassine.
Resistir sempre é possível à doença;
explorar assim é crível a mata densa;
enfrentar é factível a malquerença
quase tudo é exequível a quem pensa.
AUDÁCIA III
E quando o inimigo parece ser mais forte
e a paz do teu jazigo a negra morte,
encontras braço amigo que te aporte,
ao se alinhar contigo, melhor sorte.
E no final, que importa? A vida é ilusão,
pois rápido se corta a exaltação,
igual que se comporta a pior desilusão;
até o tédio aborta e chega a conclusão.
Percebe que a incerteza não poderá ferir,
que sua abstrata presa não passa de iludir,
ante a maior vileza aprende pois a rir
na cara da tristeza, ou, ao menos, a sorrir...
conselho I (2008)
são quimeras
que te acordam bestas-feras
no coração
pois são desejos mas não ensejos
os mil animalejos
de teu pulmão.
e daí, se respiro amor e chama?
se quando te percebo, num delírio
eu sinto as veias a ferver, martírio
que tudo pode ser menos a flama
que se agita volúvel em que ama
e se queima lentamente, feito um círio,
enquanto o pranto escorre qual colírio
e as faces se derretem como escama?
pouco me importa sejam só quimeras
as bestas-feras dessas priscas eras.
pouco me importa sejam só desejos,
falsos ensejos de falazes beijos.
somente importa que te veja nua
na prata sólida que te veste a Lua.
conselho II (11 ago 11)
são parcelas
nesse combate do brilho das estrelas
tem variedade manha e saudade
longa vaidade
não mais que velas,
dores singelas.
se te falo de amor, no meu passado
eu já amei com pudor e violência,
já amei por conquista e por paciência,
nas mil nuances do dom atribulado.
se te falo de amor, já fui amado
ou repelido, em gesto de impaciência
ou repeli eu mesmo, por prudência,
já rejeitei, também fui rejeitado.
se te falo de amor, já conheci
as mil facetas dessa Lua triste.
os mil detalhes doces da aflição,
ganhei amores, amores eu perdi.
mas dentro ao peito, firme, ainda persiste
a semente virescente da paixão.
conselho III
são exteriores
os sentimentos que teu peito roem
de solidão
ou vêm de fora ou vêm do outrora
os mil escaravelhos
de tua paixão.
se falo hoje de amor, não te aconselho.
o bom conselho só te vem do próprio peito.
ele é sincero contigo e sem defeito
e teus desejos reflete como espelho.
a mente empurra firme um outro relho,
para indicar caminho mais direito
e teu espírito se mostra contrafeito
a cada vez que repetes o erro velho.
mas o conselho não deve vir de fora
são outras luzes a te iluminar.
pois quem por ti possui maior calor
que a própria alma alçada nessa hora?
e teu desassossego só se irá acalmar
na chama acesa por teu próprio amor.