EU SOU BONITO

Compreendi algo:

eu sou bonito.

Apesar de meus cabelos desgrenhados,

de meus dentes amarelados,

de meus dedos ossudos,

de meus olhos míopes,

de meus intestinos fabricantes de fétidas fezes,

de minha coluna afetada por lordose e cifose,

de minha voz quase um arrulho,

de meu jeito de poeta maldito,

fedido,

inimigo da etiqueta e do bom senso,

eu sou bonito.

Eu sou bonito,

não pelo que o espelho me mostra.

Aliás, o espelho só mostra

o reverso do mundo.

Eu sou bonito,

porque compreendo.

E, ao compreender, absorvo

a paisagem mínima e o poema.

E, dia após dia, compreendo mais.

E mais bonito vou ficando,

vaidoso dessa efêmera grandeza.

Eu sou bonito.

Como tu és.