AVE MARIA
(OU AMOR ACORDELADO).
NOITE INVERNOSA
DESSAS TROVOADEIRA,
ONDE GALO DORME ASSOMBRADO
CALADO COM A BARULHEIRA.
NEM SE IMPORTEI COM OS ESPINHO,
BOTEI OS PÉ NO CAMINHO
E CORRI PRA TE ENCONTRÁ.
O CAPINZAL SE DEITAVA
E SE LEVANTAVA COM O VENTO.
E TOME RISCO NO CÉU.
OTONIEL, O MEU VÉI JUMENTO,
CHEGA ANDAVA DE ÔI FECHADO
TATIANDO O CHÃO MOLHADO
PERIGANDO ESCORREGÁ.
EU NEM SE PREOCUPAVA
COM AQUELA ESCORREGAÇÃO.
JÁ ESCAPEI INTÉ DE BALA.
COIVARA SEM ADEREÇO
ME FAZ ALEMBRÁ UM ASSUNTO,
QUANDO QUASE FIQUEI DEFUNTO,
SEM NEM BEM ME APROVEITÁ.
ROSINHA DE ZÉ NENÉM
ME BOTOU ENCANTADURA
COM AQUELA ANCA INFELIZ.
QUIS LHE AGARRÁ NA CINTURA
MAIS, ZÉ VENDO A MINHA CENA
NÃO QUIS REZA E NEM NOVENA,
DANOU-SE LOGO A ATIRÁ.
QUEM TAVA NA FEIRA, CORREU.
FOI AQUELE LABAFERO
E GRITAÇÃO DE MENINADA.
NA CALÇADA, PISARÔ O CEGUIM SOTERO,
QUE PEDIA ESMOLA SENTADO.
INTÉ CIÇO, O DELEGADO,
CORREU SEM QUERÊ ASSUNTÁ.
MAIS DESTÁ DE PROSAGEM
E VOLTEMO A NOITE FRIA
DE AGUACEIRO AGRAÚDADO.
MOLHADO, EU PENSAVA EM MARIA,
FIA DE LUIZ TABOCA,
NETA DO VÉI MANÉ JOCA,
QUE REMEXEU MEU PENSÁ.
NA FÊRA DE TREZONTONTE
EU VI ELA PASSEANDO
NO MERCADO DE ALAGOINHA.
VINHA ELA INAUGURANDO
UMA SANDÁLIA HAVAIANA
DA COR DE CALDO DE CANA
E NEM DEU FÉ DE ME OIÁ.
MAIS EU, UM CABÔCO ESPERTO,
AJEITEI LOGO A CABELEIRA
E CONFERI A PERFUMARIA.
NÃO IA CAÍ NA BESTEIRA
DE APARECÊ NA FRENTE DELA
CHERANDO A ARRÊI DE CELA
PRAMODE LHE CONQUISTÁ.
PERGUNTEI PELO SEU NOME,
ELA RESPONDEU: MARIA,
COM GRAÇA E CANDURAMENTO.
O CALORENTO SOL DE MEI-DIA
BRANQUIÇAVA A TORRE DA IGREJA
E LHE RESPONDI COM FIRMEZA:
O MEU NOME É JOSEMÁ.
JOSÉ POR PARTE DE PAI,
HERDADO DO MEU AVÔ.
E MÁ POR PARTE MATERNA,
ETERNA ROSÊRA EM FLÔ.
MAIS POR TU EU LARGO TUDO
FICO CEGO, FICO MUDO
SEM QUERÊ OUTRA ESPIÁ.
ELA SORRIU ADONZELADA
MOSTRANDO OS DENTE BRANQUIM,
FEITO OS DE UM GATO NOVO.
O BONDOSO VESTIDO MARFIM
MOSTRAVA O QUANTO ERA BELA.
E FOI AI QUE EU BÊJEI ELA
ANTES DELA RECUSÁ.
MEU CORAÇÃO UMBUVERDANTE
SE ADOCICÔ NESSE DIA,
DEPOIS QUE CONHECI ELA.
NA SELA, ESCREVI MARIA,
E O MESMO FIZ NA CABEÇA,
MAIS ANTES QUE EU ENLOQUÊÇA
DÊXA EU IR LHE PROCURÁ.
AQUELE VENTO MEDONHO
LEVANDO O TELHADO EMBORA.
E TOME TROVEJEÁ.
NO TRACAJÁ DAS ESPORA
METI-ME ESTRADA A DENTRO
E CÁ NO MEU PENSAMENTO
EU SÓ PENSAVA EM TI ABRAÇÁ.
DEBAXO DO AGUACÊRO
ANDEMO QUASE TRES LÉGUA,
DE ABRI E FECHÁ PORTÊRA.
CARRÊRA DO FI DUMA ÉGUA
DAVA EU MAIS OTONIEL
ATÉ QUE PERDI O CHAPEL
NUMA GALHA DE UMBU-CAJÁ.
PAREMO NA PORTA DA CASA
BEM DE FRENTE A ALPENDRARIA
ONDE O VÉI JOCA FUMAVA.
BAFORAVA UMA FUMAÇARIA
FEITO TREM NA ESTAÇÃO.
ME BOTÔ REPARAÇÃO
SEM NEM SAÍ DO LUGÁ.
O QUE É QUE VOSMICÊ QUÉ?
PERGUNTOU O VÉI EMBARBADO
PERECIDO COM FREI DAMIÃO.
NADA NÃO, FOI MEU RESPOSTADO.
ANTONCE DÊ VOLTA E MEIA
SE NÃO TE QUEBRO NA PÊIA
E MANDO MEU FÍ TE ENTERRÁ.
VOSMECÊ TÁ ENGANADO
NO PENSÁ QUE SÔ UM FRÔXO
E TENHO DE MEDO DE HÔME.
LOBISOME DE CUNHÃO ROXO
TRANFORMO EM TAPEÇARIA.
VÁ LOGO E CHAME MARIA
QUE EU QUERO MAIS ELA CASÁ.
QUE MARIA TAIS FALANDO?
SERÁ MINHA FINADA NETINHA
QUE MORREU TETÂNIADA,
INCHADA QUENÉM GALINHA,
COM QUATRO OVO NOS FATO.
DELA SÓ GUARDO O RETRATO
PRAMODE EU SE ALEMBRÁ.
SE O COMPADE PERMITE
EU OIÁ A FOTOGRAFIA,
CERTEZA QUE NUM É ELA.
ESTELA, TRÁS A FOTO DE MARIA
DISSE O VÉI DESCONFIADO
JÁ SABENDO O RESUTADO
DO QUE EU IA ENCONTRÁ.
FIQUEI BRANCO AZULADENTO,
DEPOIS FUI FICANDO ENCARNADO.
NUM ERA QUE ERA ELA MESMA,
A BELEZA LÁ DO MERCADO.
VALEI-ME SÃO PAULO E SÃO PEDRO
QUASE QUE CORRO DE MEDO
MAIS FIQUEI A SOLUÇÁ.
SE CONSOLE SEU MOÇO
VOSMECÊ NUM É O PRIMÊRO
QUE ELA APARECE ENCANTADA.
A DANADA NESSE TERRÊRO
SE DESMORTIFICA TODO INVERO.
PARECE QUE VEM DO INFERNO
PRA MINHA CASA ASSSOMBRÁ.
DESCUPE COMPADE VÉI
ME AGRADEI DESSA DENGOSA
DESDE O DIA EM QUE A BÊJEI.
NÃO SEI SE ESTA ASSOMBROSA
TAMBÉM GOSTAVA DE MIM
O FATO É QUE PAIXÃO ASSIM
É DIFÍCIL DE APAGÁ.
VOLTEI PRA CASA NA CHUVA
DE BAIXO DE RAIO E TROVÃO
VELORIANDO MEU PEITO CATIVO.
DUVIDO QUE DOUTÔ JOÃO
COM TODA SUA EXPERIÊNÇA
ACHE UM REMÉDIO, UMA CRENÇA
PRA DESSE AMÔ ME CURÁ.
À minha amiga fernada que vivia me cobrando uma coisa inédita.