AQUARELANDO
Seu moço eu sou de longe
Lá das bandas do Riachão
Tô véio e bem cansado
Escrevê e lê, sei não.
Queria saber a história
Desse Brasil tão gigante
Para contar aos meus netinhos
Que também são ignorantes.
Se puder me conte agora
Ficarei muito agradecido
Já tô fraco de memória
Mas tô bom dos meus ouvidos.
-Meu bom velho acredite
Também não sou um letrado
Nem tampouco historiador
Mas posso contar pro senhor.
Um dia Cabral avistou
Uma terra diferente
Cercada de verdes mares
Muito ouro e pouca gente
Como era Lusitano
Radiante de alegria
Deu-lhe o nome de Vera Cruz
Julgando ser uma ilha.
Era o primeiro engano
Que a terra conhecia
Após um lampejo de luz
Rebatizou-a de Terra de Sta. Cruz.
Após de ter visto a abundância
Da Caelsapinia Echinata
Mudou para Brasil
O nome da Pátria Amada.
Nossos Índios assustados
Embrearam-se nas matas
Fugindo do trabalho
E do peso da chibata.
Havia tanta fartura
Que para melhor explorar
Importou da África escravos
Para trabalharem sem reclamar.
Depois vieram invasores
Querendo também levar
Um bocado de riquezas
Mas não deu para arrastar.
E séculos foram passando
A gente ficando pobre
Nossos descobridores enricando
E nossa Pátria explorando.
Fundaram até uma cidade
Com nome de Ouro Preto
Depois levaram o ouro todo
Só restando os pobres negros.
Dizem os maledicentes
Que embaixo daquelas perucas
Tinha gente que mandava
Mas no fundo era biruta.
Então surgiram os heróis
Dos Quilombos e Inconfidência
Gente de coração elevado
Traíram Tiradentes e ele foi enforcado.
Certo dia um Imperador
Cansado de dividir
Tanto ouro e riquezas
Decidiu virar a mesa.
Dizem que deu um grito valente
Às margens de um velho rio
Mas tem uma outra versão
Que não tem lá tanto brilho.
Um dia ele fartou-se
E, pos um ponto final
Pegou toda sua família
E voltou para Portugal.
Passado pouco tempo
Um famoso Marechal
Patriota e inteligente
Proclamou a República da gente.
Do mundo foi chegando
Multidões querendo mel
E o Brasil se transformou
Numa torre de babel.
Foi tanta miscigenação
Que não temos raça por aqui
Adotamos o português
Sem saber o nosso Tupi Guarani.
Foi daí que realmente
Nossa história começou
O Brasil dos brasileiros
Será mesmo? Meu senhor.
O poder foi itinerando
Passando de mão em mão
E os artistas revelando
Sua melhor aptidão.
Teve compositor famoso
Que inventou o mulato inzoneiro
Revelando que só no Brasil
Dá côco em nossos coqueiros.
Tem nosso futebol
Que é pentacampeão
Mas o nosso hino
Ninguém sabe cantar não.
Nosso povo é festeiro
E adora de momo à folia
Passa privações o ano inteiro
Mas requebra de alegria.
Trabalhei quarenta anos
Tirando minhocas do asfalto
Hoje sou um vagabundo
Disse um chefe do planalto.
Temos uma divida externa
Como um deserto sem fim
E o povo paga juros extorsivos
Para um tal de F.M.I.
Dizem que somos soberanos
Mas não acredite nessa gente
Pois existe um tio Sam
Que pensa bem diferente.
Vou tirar de pobre identidade
Viajando de graça na condução
Porque velho na verdade
Vive nessa país, de comiseração.
Mas dizem que vai melhorar
Agora o chefe é torneiro e peão
E sabe amassar um cano
Com a força das próprias mãos.
Chora a tristeza do povo
Deplora o desamor
Mas vive correndo o mundo
Num palácio voador.
Nosso povo é bem informado
Vê política o ano inteiro
Mas tem muito pobre coitado
Que dá o voto por um chaveiro.
Ainda bem que a ditadura
É coisa de um triste passado
Senão só por essa breve história
Eu seria trucidado.
Meu senhor não fique triste
Por não saber ler ou contar
Temos milhões de analfabetos
Nas escolas para fome atenuar.
Temos o salário mínimo
Coisa linda de se ver
Dá para comprar uma corda
Para se enforcar e esquecer.
Temos homens generosos
Iluminados de coração
Que por serem tão bondosos
Recebem até mensalão.
Um mimo dado pelo povo
Que um dia neles votaram
E votarão outra vez acredite
Manias de perdulários...
Esse é o nosso Brasil brasileiro
De um povo generoso e sério
O coração desse mundo
Doce Pátria do Evangelho.
-Seu moço muito obrigado
Pela história tão bonita
Mas vou vortar correndo
Para os braços de minha Anita.
E vou dizer pro senhor
Que agora pude entender
Tens coisas nesse mundão
Que é melhor nem saber.
Sou velho e ignorante
Mas digo para o senhor
Que no rumo dessa prosa
Não ouvi a palavra amor.
Ele renova esperanças
Iluminando os caminhos
Apagando às más lembranças
Corrigindo os desatinos.
Moro na roça distante
Mas bem longe do rancor
E aprendi nesse instante
Que ali é o reino do amor.