A ESPERA

As unhas estão cheias de terra

das muitas tentativas de vencer o abismo

Das muitas vezes que chegando ao topo

se é lançado de volta para o fundo

Aquele que nunca chega: o fundo da base do mundo

Dos ressentimentos - vis sentimentos, de amargura e dor

Rasgo o peito com o ímpeto de um animal

Indócil, valente, sagaz, destemido, irracional

Quero minha vida de volta, quero meu corpo e minha alma

Há em mim a angústia do retorno, a espera da calma

A insanidade miserável de quem já foi, virou passado

Não há aurora na escuridão calada do meu coração

Há uma dor que teima em doer e uma lágrima que teima em cair

Uma voz rouca escondida por trás de um grito abafado

Não quero migalhas, restos, pedaços, quero tudo por inteiro

Escancara os meus defeitos (que não são poucos),

Jogue-os junto a mim, no chão imundo da minha consciência

Atire-os contra mim, um a um como pedras: apedreje-me

Mas não lance sobre mim uma punição eterna:

A de não mais sentir a sua presença

A de não sentir seu perfume passeando pela minha lembrança

A morte poderia até ser um alívio a este corpo sedento de descanso

Caso ele já não estivesse morto.

Morri tão logo suas mãos soltaram as minhas.

Morri tão logo seus lábios recusaram-se a dizer

o adeus que seus olhos já diziam.

Volto-me para dentro de mim. Silencio.

Vejo, à distância, a poeira levantada no caminho...

Vai dissipando lentamente junto aos meus pensamentos...

Reminiscências de uma vida – esta que parece outra

Vejo sumindo ao longe, a imagem, o pensamento,

O sonho, a poesia, a poeira, a esperança, o amor...

Vejo, à distância, o peso da mentira,

A omissão que virou pecado,

O pecado que virou doença

A doença que virou saudade

A saudade que virou culpa

A culpa que virou espera...

Silvana Moreli
Enviado por Silvana Moreli em 23/06/2011
Reeditado em 21/07/2013
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