SOU EU
SOU EU!
Tua primeira ruga
foi um anúncio meu.
fui eu chegando quando
teu cabelo embranqueceu.
tua expressão modificada
tua mão toda enrugada
tua coluna dolorida...
sou eu, chegando em tua vida.
tua vista que de longe exergava
e agora cansada
já não é mais tão precisa...
as dores na coluna,
os joelhos a ranger
sou eu chegando sem que
possas me reconhecer.
Teus 'ais' de desconforto
pelo corpo a doer inteiro
teus ossos enfraquecidos,
teus ouvidos a falhar
na audição.
tua mão a apoiar-te na parede
tua falta de sede pela vida
sou eu, chegando sorrateira,
sem ser por ti, reconhecida.
tuas falhas de memória,
memória esta que dizias
a todos privilegiada,
sou eu já dando entrada
chegando em tua vida para ficar.
o teu calar sabiamente silencioso
o titubear no teu andar
o teu amanhecer mais cedo
teu medo da morte aflorando
sou eu me alojando
e chegando espaçosa
para em ti livre, habitar...
cheguei...
e junto comigo
trago o medo da solidão.
afasto de ti o falso amigo
e ataco ferozmente tua pressão.
ônibus para ti, já não pára.
a entrada do teatro, menos cara,
nem fila em banco pegas mais...
e tu corres atrás do tempo
tempo que não volta, jamais...
o jovem te cede cuidadoso
um lugar alaranjado no metrô.
e te beija o rosto um belo moço
te chamando de vovô....
sou a visita indesejada,
mas fiel.
sou tudo o quanto eu te disse
o meu nome é VELHICE,
e faço em tua vida
sabiamente,
o meu papel!
LirÓ CarneirO