Não mate a barata
Viajei por muitas estrelas. Comprei tabaco e voltei pro casamento.
As árvores ainda verde esverdeava tudo pela frente. A tarde, há meu deus,
a tarde. Tão bonitas e simples mascarava brutal o fingimento de Gabriela.
A pior de tudo que ela se sabe doce, se sabe amor. Que importa, o que quero
Mesmo é anda de bicicleta com cabelo solto, deixar a barata viver. Que me importa a barata. Não vou alimentar industrias.
A geladeira esta fria, o fogão calado. A casa suja me enoja
Quero ir embora desse mundo. Comprar chicletes de algum astronalta louco. Voltar pra escola, quem sabe fazer um curso de inglês. Matar um político nem pensar. Tenho medo da repressão. Mas não me falta vontade. De sentir no sangue o aroma avassalador da satisfação. Sonho de ícaro. O prazer exagerado as vezes tem muito custo. Por isso quero dormir da relva. Dói, mas pelo menos falseia a vida.
Odeio ver tudo de uma vez. Prefiro as partes. Os incômodos, as faltas. Pedacinho por pedacinho. A exatidão das coisas me faria um burro de carga. Seu João Lotério, levava no lombo dos cavalos, areia pra vender, pouca e barata. Passava fome, muita fome. Até ganhar milhões na loteria. Assassinou a mulher e comprou um carro novo, fez barba, comprou um terno. Mudou sempre e continua comprando coisas. O dinheiro virou camiseta e asfalto.
Muita coisas assim me vem a cabeça, me aprofunda e me assusta.
Se pelo menos eu tivesse batido em Bel, socado o pescoço dele. Mas deixa pra la. Fico com essa falta comigo. Matar de novo? Não dá. Prefiro agora as ruas movimentas. As calças largas. E o dinheiro suado.
Grande coisa viver sem dinheiro. Quero andar de carruagem puxada por cavalos grandes, arrogantes. Cheio de si.
Dancei muita ciranda quando criança. Joguei muito caraté nas paredes, bati apanhei. Mas a cabada de vassoura de Vó Pompinha foi demais. Nem cavalo ela tinha, nem verde ela era. Era manca, uma vida manca era o que ela era. Jogava café no chão e passava o pé em cima. Sujando o resto
Da casa. Casa, casa, casamento. Que foi que herdei, cheio de sujeira no chão. E ainda quer ser noiva de algum paraíso na terra. Vai ser sim, um padre assustado nas feiras de raparigas.
A vida de minha cidade esta entre os rios, entre as serras, cheia de gente feia por fora e por dentro, jogando janelas trincadas pelos carnavais. Que desespero esse. Que saudade essa. Da feira quero uma maçã bem grande, não pra comer, mas pra enfiar na cara, cidade de merda, merda de flor, de asfalto quente e um doido de roupa francesa, latindo de noite.
Que terror é a vida dos loucos na noite, fabricando bichos e cadelas a cada instante. Se tudo parasse. Se seu Eilson fosse um pouco doce, um pouco mais vivo. Mas não, ele parece com a dita cidade. Ele parece merda. Quer andar de carruagem com os pés imundos, bota suja e rapariga a lhe cobrar. Vamos ao mundo, jantar com bodes, assistir desfile militar. Mas não mate as baratas.
Elas são de marte.