Varre o mundo
Varre o mundo meus sóis,
entre bemóis, caminha em ventos a dor,
tão tua, tão minha que o nada se aventura,
nos cálices carregados em louvores de amor.
Partilha a vida na morte que toma para ti o tempo,
apara as garras nas jugulares encontradas em teu ninho,
beba do sangue, saibas para ti do verbo antes nunca dito,
no corpo maldito encontrado em exílio
pelos átrios perdidos de toda tua misericórdia.
Fala de ti, cala o que és, renega o tempo que tua alma tocou,
canta se puderes, os prantos não esperam pelo fechar de teus olhos,
tendes os pés acorrentados por ferros que te impedem o vôo,
sinta portanto em ti o desejo do alto, fazendo-te prisioneiro
de tudo que um dia a ti mesmo agregaste.
Olhe a tua volta, vê dos bens que a tua alma privaste,
morre tua morte no jazigo que em vida cavaste,
torna ao manto da terra que perfidamente arruinaste
e sente na tua boca o gosto do fel
que em tantas outras tu mesmo semeaste.
Morreu o guerreiro no tempo que não reteve em tuas mãos,
de ti, restou apenas a sombra do que fostes, ali, ao longe,
vê-se nova paisagem, um novo sol talvez, das bocas caladas até então,
um resto de vida espalhando a nova era que surge
pelos olhos dos que acreditam e carregam em si a esperança.
18/09/2006