Permito-me amar
Seria fácil, talvez até lógico dizer adeus,
seria talvez sensato apartar o seu do meu "eu",
talvez também fosse mais sóbrio afastar de mim
o cálice que tua mão me estende,
oferecendo o novo no todo da vida que em mim renasce.
Fui velha chama apagada buscando por novos dias,
vivi a incerteza de ser, invólucro da dor,
sensata, fiz-me sonho, depois, apenas poesia,
revi minhas rimas nos versos funestos que escrevi um dia,
percebi-me nua caminhante em cruel multidão
onde meu pranto nunca era ouvido.
Desfiz o caminho, recriei em meio às lágrimas novos rios,
pisei com meus pés descalços os sonhos tão sonhados,
onde a princesa descobriu seu príncipe na alma de um simples sapo.
Cantei só, e meu canto, desprendido em sol,
acompanhado de acordes marcando-me em compasso,
perdi meus ritmos na dança ensaiada num palco,
a ilusão tremula era vista em pano de fundo
na performance da amante que nem bem sabia
que em pranto nova aurora em céus escondidos renascia.
Dormi meus sonhos na busca constante da paz,
vi-me andarilho pelas mentes descrentes que o mundo traz,
desfiz as correntes dos mares onde náufraga me encontrei,
desfiei rosários em altares sem deuses onde adeuses ouvi
e num instante, novo sol, nova luz, novo passo,
revi no teu compasso o muito da vida que sem saber, perdi.
Hoje, abrindo os olhos da alma que nem sempre ousei permitir,
vi o amor vestido de homem no olhar que o meu tentava,
vi-me mulher renascida no toque das mãos que me fizeram emergir
das tórridas tempestades onde destruída um dia me escondi.
Hoje, só hoje, amante amada amor, amar me permiti
e entreguei-me, descompassada, aos abismos de uma alma,
que na minha própria, amor, somente amor, descobri...
10/10/2006