UM CORAÇÃO EXPOSTO ÀS FLECHAS

Não tinha amor.

Não tinha metas.

Preso ao silêncio, calava o espírito

por medo de expor o coração

às flechas.

Por medo de falar,

falava em chagas,

feridas expostas,

mentiras.

Inútil, podia morrer.

Sentia algo

que ele dizia ser paz

em meio ao barulho extremo.

Morava na rua,

apesar do quarto na mansão.

Era uma criança

no ventre de uma mãe morta.

O único calor que sentia

era da canícula

prevista pelo jornal.

Mas ela veio

e trazia nos cabelos as flores

que ele nunca vira antes;

no vestido, as cores

que, cego, ele não sabia existir;

no corpo, a fluidez da dança

que ele, estático, nunca arriscou;

no olhar, a leveza

de uma imensa poesia.

E ele aprendeu outro mundo,

descobriu em si

versos ansiosos para existir,

virou poeta.

E, do menino,

surgiu generosamente

um homem.