O Baile das Sombras ( à Áurea; a musa das oito letras)
Quando te procuro
Sequer uma fresta de alento
No teu coração existe;
Então me fecho à mim mesmo
E sufoco o fogo que arde em meu ventre
Com a água insana dos mortais;
Porque não te vejo!
Quando te procuro
Nas horas de solidão,
Por que não te vejo?..
Nas ruas, as curvas transeuntes
Com suas fantasias desvairadas,
Seus suportes de metal fluorescente,
Ou simplesmente as curvas,
Não me importam!
Porque não as vejo, as curvas,
Em vão me envaidecem
Com seus sorrisos tristes, aparentes...
Por que não as vejo
E nem me importo com elas?..
Porque não te vejo!..
E vão as horas noite a dentro,
Sem festa, sem música, sem rítmo;
E eu me envolvo com as sombras,
Aquelas que do passado transpassam
O tempo de sua vida e chegam pra ficar
No peito ardente e solitário,
Inflamado de um amor perdido,
Estranhamente não dígno,
Por estar num tempo de nós e amarras
Que nem as virtudes são capazes
De remover de seus lugares,
Pois são amarras da sorte, da vida,
E não da escolha de mim...
Deixa, que não me importo!
Pois o tempo me diz que a luz
É de todos os tempos:
Do dia, da noite, da esperança,
E até do desejo,
Comum e distribuído uniformemente
Entre aqueles que são assim:
Insones da paixão,
Solitários da noite,
Amantes dos dias e do tempo da vida,
Onde ela nasce com todo o seu mistério,
No dia, na noite... Óh! Vida!
Que dirás de mim que já não sei
Onde buscar a tua sorte...
Será que me importo?
Será que viverei o pecado da insanidade,
Por ela?
Ah! Distância! Óh! Sombras, se acheguem
Que o dia está bom e estou bem,
Parcimonioso e cético de suas dores;
Já não me importam, nem me assustam;
Convivamos harmoniosamente este dia
Que esta noite tentarei,
Mais uma vez,
Inutilmente, caminhar ao lado dela,
Tocar seu colo com o meu
E ouvir a música dos anjos,
Diante do vinho santo dos inocentes;
Mas se não der, retorno a vós,
Com a alma em chagas, o peito em lágrimas,
E valsaremos o baile lúgubre dos ébrios sem destino...
Até o sol raiar.