Martírio

À noite, quando meus sonhos ardentes

Fazem-me resvalar macilento no leito,

E a insônia lateja-me as artérias;

Teus amores, T...,arqueja-me o peito.

Vejo-te pura, entre as nuvens alvacentas

Dos meus devaneios frebis e tresloucados;

Brilhante e grácil qual flor purpurina,

Pueril acariciando os cabelos perfumados.

Às vezes te vejo pálida, desgrenhada

Os olhos turvados numa tétrica solidão

Pergunto-te: por que deixaste o verminoso

Libertino, magoar teu inocente coração?

Não tenho resposta! apenas contemplo

Nódoa purpúrea, que tuas faces vela...

E longe, num lupanar pecaminoso

O libertino, que de ti ri, virgem bela!

Entre os véus diáfanos da noite escura

Blasfema o covarde! enquanto eu pranteio

Temendo o sepulcro fogoso e pútrido

Que parece me esperar para o enleio.

Ele e as venais, atônitos riem de ti

E eu, sinto as lágrimas amarelas e frias

Que dos teus castanhos olhos de anjo

escorrem , pelo vagabundo das orgias.

Murmuram teus pequenos lábios de nácar

Chamando-o debalde! acorda afermentada

Minh’alma, que outrora, cheia de luz

Nutria tua suave doçura, virgem adorada.

Arfa em meu peito, minha imortal ternura

Desperto pálido, debulhando-me em pranto;

E só, em minha alcova moribunda, pergunto

A luz rutilante do teu harmônico encanto:

Anjo do meu amor! vestido de branco

Quando este borracho poeta adormecido

Num rio lodoso de esperanças vãs...

Amar-te-á, antes de ser na campa esquecido?

Dionatan

Dionatan
Enviado por Dionatan em 12/12/2010
Reeditado em 12/12/2010
Código do texto: T2666764