BEIJO DEMORADO

Teus cabelos são acariciados

Pelos fios doirados enredados na fronha...

Meu coração, minha mente, meu tato

Recompõem-te o restante, requintadamente,

Multiplicando num ritmo atordoante tuas células,

Teus órgãos e tecidos, tua derme macilíssima...

Recomponho-te do topo das mechas aloiradas

À ponta cinabrina dos pés bem pintados

Teus lábios, lautos, investem-se do mesmo sorriso,

Revivem teus gestos largos e calmos,

Tuas ágeis mãos maliciosas,

Tuas voz ardilosa à margem do ouvido...

E vêm-me mais sensações como prendas...

O aroma debilitado das açucenas,

Do capim-amarelo, do alecrim-do-mato

Dos passeios ao remate da tarde...

O embalo cismático dos ricos olfatos

Causa-me o adocicado gosto de tua língua

Revive o frisson arriçado de minha nuca

Naquele beijo demorado ao meio da restinga

Tudo se revigora em meus sonhos desarrufados,

Repete-se em atos recidivos, sem remanso,

Longe de teu singular desempenho ao vivo...

Sempre, sempre... efundes-me emoções ao peito

Incluindo a angústia cansativa de não te ter

Perto de meus olhos que precisam te crer...