À ESPERA DE UM MILAGRE
Olhos bruscos invadem o homem de terno,
Olhos delatadores,
Apontam como chamas na mente
Os dardos sedativos.
É o homem um canalha meticuloso
Com direito a flores no bolso
E gravata cor de ameixa.
Leva o destino de várias pessoas,
Leva a carne,a sanguessuga,
Leva a palavra desencontrada.
Pára sob uma janela fantasma
E retira do bolso um poema
Declama para um palco vazio
E inventa na lua uma donzela.
Vagabundo politizado,
Argonauta de sonhos precisos,
Defensor de realidades impossíveis.
O homem foge
Para uma noite embriagada,
Foge com seu desespero de amor.
Amanhece na cidade ruína,
Os passos e as pessoas
Começam um novo calendário,
Renovam-se as dores,
Burburinho nos mercados.
E o homem ali,atravessado,
Espectro real no espelho,
Cravado com sonhos pelo corpo,
Salgado pelo sol que insiste em nascer,
Desmemoriado,torto,
Definitivamente curvado
Sobre a fonte dos desejos.
Fantasma afinal dos beijos rabiscados,
Morto dentro do próprio poema
Que um dia traduziu por escrito
Ao seu amor inventado.