É noite, e os cães ladram, o que lhes é natural;
Antinatural é este silêncio que irrompe da falta da luz artificial;
Eu leio o anuncio do jornal:
No Chile tudo foge do normal!
Reacendo a vela e assumo as vistas outro editorial.
Leio um livro dosado de prima poesia formal,
Diz das dores dos mesmos amores desde os idos de Cabral
Este mesmo, nosso primo ancestral,
Das terras de camões de Eça e Pombal.
Exausto da deformidade e do custo banal,
Desta poesia teatral, saio a ver a lua, esta sim, primor sem igual;
Permanece, melodiando o céu com sua luz sideral,
E encerro as rimas.
Minhas vistas já não primam
Pela acurada forma de antes
Vejo temas preliminares e constantes
Cegueira que insiste no amor factóide
Que enrubesce dos castos aos delirantes
Sou quase cego, não vejo adiante, fiz parada no tempo
E o tempo esta agora em silencio,
E nenhum homem fala de si, senão por delírios maquinais.
E este homem quase cego, tateando no tempo
Tem um só coração e ele é em nuvens plúmbeas
Demarcando a chuva tórrida que no hemisfério norte cai
Sou suave amargor na boca da natureza
E logo serei cuspido
Para a vala dos comuns
E na tumba do tempo serei apenas
O alimento de algum pássaro
Que cantará minhas memórias
(Saravá!)
Reacendo a lâmpada e Aladim por ela sai
Ri, e estala o dedo e tudo esta no controle
(já não penso) dou o clique do abajur
E eis a luz
E com ela o santo Fernando Pessoa
Sisudo e aposto
Na capa do livro de cabeceira.
Envergonhado,
Digo-lhe:
Perdoa-me, pois pequei.
Li isto ai, que não sei!