Lapsos de amor
Lapsos de amor
O rubro do pôr-do-sol rivaliza com o coro de teus gemidos, sofridos gemidos tardios, ganidos de mulher a orgasmar.
As marcas de tuas unhas, afiadas garras em cio, cortam a pele das costas, acompanhando a cascata de múltiplos espasmos sem fim.
Que cena mais linda, contemplar teu corpo despido em repouso, pálpebras semicerradas, leves arquejos de gozo, seios apontando prá mim!
Séculos fiquei a esperar por teus beijos, inusitados beijos famintos a invadir minha boca sedenta, os mesmos e inesperados desejos a regurgitar.
Quisera poder te reter por mais tempo, mas para o amor estás sempre apressada. Abraço, com ternura, teu corpo perfeito, percebo tua voz trêmula, titubeias – visivelmente estás assustada.
Fizemos um amor diferente nesta quente tarde de fim de Verão. Sexo com amor: disseste-me judiciosamente; um sexo de forma plena, cavalos selvagens em galope, mistura equalizada de amor e tesão.
Que pena que partes tão cedo. Retenho, previdente, o intermitente estremecer de teu corpo, o dissolver do chocolate que degustamos aos poucos, bocas grudadas em sofreguidão.
Quero te amar com vagar, honrar tuas colinas e vales, beijar os teus seios sem pressa, morder tua garganta com fome, não me contentar com parcas horas da tarde – mas te amar, sem paradas, enquanto existir madrugada.
Foste embora. Mas esqueceste o teu cheiro comigo, a marca de teus dentes cravada em meu peito, antropófaga tatuagem que fizeste em delírio, rastros a te denunciar.
Guardo, ciosamente, estes tesouros tão raros, aquecer-me-ão nas muitas noites de frio que virão, preencherão o imenso Vazio que a tua falta deixa tão patente, cicatrizes impossíveis de esconder.
O que mais me ficou desta tarde de tantos atos marcantes, não foi nosso sexo ardente, foi o dialogar sem palavras contigo, estabelecer uma sintonia afinada, juntar, num só, o nosso mesmo querer.
Conseguimos, em parcos instantes, fazer um amor sem igual, um amor como nunca havíamos feito, como se tivéssemos todo o tempo do mundo, como se o tempo que tínhamos jamais fosse acabar.
Não há beleza maior, para mim, do que participar, como honrado coadjuvante, da lúdica viagem orgásmica de uma mulher. Fico parado, extasiado, a apreciar este momento só dela; apenas a sentir as suas contrações, discurso pélvico de um corpo que declama uma ode a Vida.
Cidade dos Sonhos, noite de Sábado, meados de Março de 2010
João Bosco