n.º 301 (ou "a morte II")

o 301 parece número de quarto de hotel

parece número de ônibus circular

parece número de cela

modelo de computador

número de mortos num terremoto

mas é este 301

o meu texto 301 neste lugar

este recanto de engano eletrônico

que de recanto só tem o nome

lugar onde a fome é o prato principal

minhas mortes:

em 1969, com saudades do útero de emília

mais tarde, aos meus seis anos,

morto fui pelos olhos verdes de cristina

ou aos meus 14, no ventre quente de rosana

(e orgasmos são mortes)

morri também trabalhando

morri cantando

morri dando vida

morri tanto na minha vida...

e o bom de morrer tanto

é saber

que guardo sempre

o melhor

de cada vida passada

com possibilidades de interação

entre os mundos mortos

e os mundos vivos

301

é um número que lembra recomeço

morte e ressurreição acopladas

que bobagem...

os algarismos nada são

sou eu quem existo

amando, desarmado, confundindo

confuso, intruso de mim

homem comum

sou mais que 300

sou natal

sou uma coleção de natais.