Fica...!
Há uma bala
Disparada
Em direcção ao meu coração
Olho em volto
Para ver quem disparou
E reparo
Que tens
Uma arma na mão…
Terá sido de propósito
Ou um mero reflexo instintivo?
Pois depois
De juntos tentarmos afogar os nossos fantasmas
Reparámos
Que eles aprenderam a nadar à superfície das nossas mágoas
Optando Tu
Pela solução radical
De tentares eliminar
Quem sabe
Do mal
Que te corrói
Que te mata
Que não te deixa viver
E assim
Eu sou o primeiro alvo
A abater
Só por saber
O que és
O que te consome
O que te faz sonhar
Só por saber
O que tu amas
Ou deixaste de amar
Em mil viagens
Que fizemos
E que nos colocaram
À margem
À margem do todo absoluto
Bem dentro da dor
Pois paisagens presentes
Colocavam-nos em luto
Por um passado
Não assumido
Por um passado
No qual estavas comigo
Mas nunca
Nunca conseguiste
Ter a clarividência crua
De saber
Ou assumir
Que a tua alma
Não era só tua
Que te entregaste
A mim
Ao meu lado que te protegia
Que te velava as noites
Onde os monstros debaixo da cama
Te queriam devorar
Sendo a minha presença
Eternamente acordada
A única forma de os evitar
E assim um dia
Numa espécie de madrugada reveladora
Descobriste
Que eu representava mais uma recordação dolorosa
Do que um futuro luminoso
Acendeste um cigarro
Pensaste
Mais um bocado
Tudo em silêncio
Regressando aos mistérios
De antes de mim
Regressando ao campo de enigmas
De sombras
Campo minado
Onde tinhas aprendido a caminhar
Campo
Para onde decidiste voltar
Sem tal
A mim comunicar
Mas eu amo-te
Na minha demência pela vida
Eu amo-te
Com ardor terrível
Com uma terrível dor
E assim
Antes que a bala atinja o seu alvo
Só tenho uma palavra para ti
Que tudo significa
Que tudo revela
“Fica…!”