Oração ao amor errante...

É ao pensar em tí que tudo se esvai

ao sondar o silêncio em que teus olhos repousam

não em mim, nunca em meus surtos

mas no vazio que ronda meus desejos tão sóbrios...

É pensando em tí que escrevo

vez ou outra, ou sempre, sem firmeza

em agouros que crescem mais que eu mesma...

e somem, calados, com o vento, entre as trevas...

Exatamente nas noites que invernam,

nos sinos que retinem, nas horas que passam

na letalidade dos sonhos que sonho contigo

acenando à suas mãos e ao teu contorno surreal...

Claras as manhãs, passo-as em ti, sorrindo

imaginando voltar ao momento doce do beijo

desejando em teu olhar de dourado-vivo

inundar-me deste amor tão triste, tão torto...

E, calada, abrir as portas dos céus de Limbo

e, ainda calada e profunda, a mesma seta lançar à Ares

e dele apanhar os restos do que em mim seria amor

e comungar sobre o seus manjares doces, o fel de meu desejo ébrio...

quem dera, profunda e consternada, cobrir teus pés de malvas

arder, em juízo, e mais nada

aquietar-me na luxúria que teus olhos persuadem e lançam

e, calada, também amar e ser amada...

Teus olhos dourados, breves

d'um ouro que chama-me à vida

e, se, à vida me entregar, somente

dele, escrava, serei até seu arfar derradeiro

deus que em mim cerca vales

doces lágrimas à afagar-me, solene

e em teu peito entregue, amar-te um instante:

é meu pedido absurdo à esta estrela cadente!

Anna Beatriz Figueiredo
Enviado por Anna Beatriz Figueiredo em 05/01/2010
Reeditado em 05/01/2010
Código do texto: T2011785
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