Oração ao amor errante...
É ao pensar em tí que tudo se esvai
ao sondar o silêncio em que teus olhos repousam
não em mim, nunca em meus surtos
mas no vazio que ronda meus desejos tão sóbrios...
É pensando em tí que escrevo
vez ou outra, ou sempre, sem firmeza
em agouros que crescem mais que eu mesma...
e somem, calados, com o vento, entre as trevas...
Exatamente nas noites que invernam,
nos sinos que retinem, nas horas que passam
na letalidade dos sonhos que sonho contigo
acenando à suas mãos e ao teu contorno surreal...
Claras as manhãs, passo-as em ti, sorrindo
imaginando voltar ao momento doce do beijo
desejando em teu olhar de dourado-vivo
inundar-me deste amor tão triste, tão torto...
E, calada, abrir as portas dos céus de Limbo
e, ainda calada e profunda, a mesma seta lançar à Ares
e dele apanhar os restos do que em mim seria amor
e comungar sobre o seus manjares doces, o fel de meu desejo ébrio...
quem dera, profunda e consternada, cobrir teus pés de malvas
arder, em juízo, e mais nada
aquietar-me na luxúria que teus olhos persuadem e lançam
e, calada, também amar e ser amada...
Teus olhos dourados, breves
d'um ouro que chama-me à vida
e, se, à vida me entregar, somente
dele, escrava, serei até seu arfar derradeiro
deus que em mim cerca vales
doces lágrimas à afagar-me, solene
e em teu peito entregue, amar-te um instante:
é meu pedido absurdo à esta estrela cadente!