"QUASE DECLARAÇÃO"
Meu sonho, eu te perdi; tornei-me uma mulher.
A melodia que mergulha no fundo de minha alma
é simples e fatal, mas não traz carícia
lembrar-me de ti, melodia criança, de ti
que te transformei em poesia sem melancolia,
levavas em cada palavra a ânsia
de todo o sofrimento vivido.
Queria dizer coisas simples, bem simples
que não ferisse teu coração, meu amor.
Queria falar em Jesus - falar docemente em Jesus
para acalentar tua esperança, minha vida
queria tornar-me mendigo, ser miserável
para participar de tua beleza, meu amado
queria minhas amigas...queria minhas inimigas...queria...
Queria tão exaltadamente, meu amor!
Mas tu, melodia
tu, desgraçadamente, melodia
tu que me afogaste em desespero e me salvaste
e me afogaste, de novo, e de novo me salvaste
e me trouxeste à borda de abismos irreais em que me lançaste
e que depois eram abismos verdadeiros.
Onde vivia a infância corrompida pelo trabalho,
a loucura, as mãos cheias de calos, idéias e idéias em lágrimas,
e castigos e redenções mumificados em sêmen cru
tu iluminaste, jovem dançarino,
a lâmpada mais triste da memória...
Pobre de mim, tornei-me uma mulher
de repente, como a árvore pequena
que a estação das águas
a seiva no húmus farto estira o caule
e dorme para despertar adulta
assim, eu, voltasse para sempre.
No entanto, era mais belo o tempo que sonhavas...
que sonho é minha vida?
A ti direi que és tu, meu bem!
A você, no pudor de falar antes a vossa grandeza
direi que é esquecer todos os sonhos, minhas amigas.
Ao mundo, que ama a lenda dos destinos
direi que é meu destino ser poetisa
a mim mesma, hei de chamá-la inocência,
amor, alegria, sofrimento, morte, serenidade.
hei de chamá-la assim que sou fraca e mutável
e porque é preciso que eu não minta nunca
para poder dormir.