Minha Adorável e última Professora

A taça deu um beijo de sangue

Redondo e circular no mangue

Da branquinha fórmica

Balcão Prostituto que se dá a todos cotovelos

Boteco-bordel em que o álcool aniquila os zelos...

Me lembrou a lisa acidez da fórmica

A formiga e o formigueiro

E estes lembraram-me da vida stórmica

E para o onde, nos tirando do donde,

Nos leva esse carreiro.

Pensei no diabo, primeiro

Mas lembrei na seqüência

Que o diabo não existiria

Sem a de Deus existência.

E procuro esquecer do que sou

E evito me perguntar para onde vou

Porque sei bem de quem me trato

E sinto vergonha de por que não me mato

Se não nasci para viver

Se tenho asas de avestruz

Se eu me condeno sem possuir sequer uma cruz.

E descubro que é porque nasci morto

Que não consigo me morrer.

E penso que a única saída

A que dará um clarão no meu viver

É aceitar o teu punhal de vida

E me deixar, minha querida!

Ser trespassado e gritar pelas costas

Através da fuga da morte, dos pulmões.

E chorar o Amor das tuas aveludadas palmadas

Que me tentam a rir das dores passadas

E ver nas formigas enfileiradas

A fila natural, apesar dos novos carreiros

E perceber que, apesar de não me dar valor

E de achar que a vida não tem jeito

Sem o pouquinho deste meu ínfimo a ela Amor

Talvez o formigueiro jamais seja perfeito

Porque sem eu para sofrer a minha parte

A humanidade será eternamente inadimplente.

Então, Amiga minha e mulher, eu vou te obedecer

Eu vou preferir me suicidar inversamente

Como eu acredito que já nasci morto e impossível

E que te Amo sepultadamente

Vou tentar levantar-me, compreenda, lentamente

Da minha vida-sepultura

Para te Amar adequadamente

Não como zumbi, mas como criatura

E dedicar a ti, espelho meu da natureza

O meu inverso suícidio

Para poder te orgulhar e te saudar

Quando as operárias formigas discutirem o dissídio

E, para orgulho teu, me elegerem como varredor do sindicato

E, eu, ao receber a chance de falar

Possa dizer no velho megafone

Das tantas lutas que valeram lutar

Que eu só me dessuicidei

Porque me mostrastes as não-diferenças

Que há entre Errar

Julgar

E Condenar

Aos outros

Pelo que a gente não sabe evitar.

Aldo Urruth
Enviado por Aldo Urruth em 04/11/2009
Código do texto: T1904565
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