O Que Tu Amas em Mim

O que tu amas em mim, não sou eu.

Não o desassossego da insônia que cultuo

nem o verso febril que te festeja.

Não amas a inquietude das marés

nos meus olhos que te buscam

nem o ímpeto da rosa na boca que te beija.

Não amas o universo em que transito,

fronteira entre a loucura e a palavra...

Sou metáfora de mim na leitura que me fazes.

Tu não amas a antítese em que vivo:

Lírio e fogo conjugados

no que sou de pastor e guerrilheiro...

Tu não amas a minha ira de setembro

que se insurge indefensável

na florada da roseira.

Nem amas em mim o que padece

na infância abortada sob o teto das marquises.

Eu sou um pleonasmo rebelado de amor.

Tu amas em mim a tua imagem

que me encanta com o pão de cada beijo

e grita primaveras nos meus olhos.

A louca utopia que cultuo

de inaugurar contigo

uma nova humanidade.

O que tu amas em mim é teu sinônimo.

A outra que te tornas nos meus braços,

a que chega com flores e bandeiras.

O que tu amas em mim, desconsolada,

é a possibilidade luminosa

de fundarmos a esperança.

Tu não amas em mim a realidade

mas o objeto do sonho que cultivo

do abstrato no concreto...

O que tu amas em mim não sou eu:

O que tu amas em mim é o reflexo

da tua luz brilhando em nós.