A menina do sorriso fácil

A menina do sorriso fácil andava sempre a passos largos.

A cada passo que dava, morria um pouco mais.

Sempre, por medo de morrer, dava mais um passo.

(e assim sorria com a vida)

A menina do sorriso fácil era encantada.

Tudo que a ela se aproximava se grudava,

Toda vez que algo lhe grudava, outro algo ficava para trás.

A menina do sorriso fácil sorria mesmo quando tinha que se zangar.

Não que ela não se zangava, sorrir para ela era tão natural quanto respirar.

A menina do sorriso só não ria da morte. Não riu quando me viu desgrudar.

A menina sofria por não conseguir levar tudo e deixar pessoas para trás.

E, por não entender que o mundo é assim, que não se pode entender tudo.

A menina do sorriso fácil se sentia sozinha, abraçada com o mundo.

Um dia a menina sofreu, sofreu pra valer.

E, para compensar a dor, desatou a correr.

Os passos se tornaram mais largos e o sorriso opaco.

O mundo seguro a ela começou a chacoalhar

E as coisas se desprendiam e se juntavam rápido demais.

Em um dia chuvoso, em uma curva perigosa eu me desgrudei.

Senti os dedos da menina tentarem me segurar,

Mas o mundo era pesado demais e a menina não sorria.

Me agarrei o máximo que pude.

Trouxe um pedaço da menina comigo.

Trouxe um pouquinho da menina em mim.

A menina passou feito um trem.

A menina juntou outras coisas rápido,

Mas a menina deixou pelo caminho um menino do sorriso fácil.

O menino do sorriso fácil anda sempre a passos largos.

A cada passo que dá, morre um pouco mais.

Sempre, por medo de morrer, dá mais um passo.

(e espera encontrar-se, um dia, com a menina que o deixou para trás)