Sonata na Madrugada
Amada! Deita a cabeça em meu peito e descansa, bem mansa, aqui comigo, longe de todo perigo, das agruras desta vida tão dura.
Olha-me com teus olhos castos, arranha-me de leve, um suave arranhar de gato, com teus dedos, e faz de meu corpo teu repasto.
Diz-me bem baixinho, com teu jeito cheio de carinho, meu nome, e faz-me saciar, sem pressa, sem medo, tua fome.
Venha! Saia comigo deste viver conturbado. Olha lá fora, há bem mais luz - é noite de céu estrelado.
E o sussurro da madrugada, música silenciosa em nossos ouvidos, encobre teus ternos gemidos.
Um raio de luar vem te espiar. Atrevido! Traz seu farnel de cores prá em nossos sabores deixar misturado.
Teus lábios, trêmulos, têm gosto de água doce, daquelas águas tranqüilas, águas frescas de regato.
Teu abraçar é quente; junta, amada, teu corpo ao meu, sem mais demora, pois pressurosa, lá vem a aurora
Anunciando, como carta de alforria, um novo dia. Deixa que eu me prostre, em prece, no altar de teu ventre, em uníssono torpor – agora!
Amada! Em ti vejo-me sobrevivente. Rogo um instante ao Sol, para que retarde da Lua a procura.
E dê-me a graça de ser muito mais que teu amante, fazer de ti minha mulher mais amada – fazer de mim teu homem.
Neste momento pleno, antes do dia nascer, deixo em ti, exangue, minha vida verter.
Sei o quanto te quero - sei o quanto por ti sou querido. É mágico aquele momento em que ainda não estamos acordados de pleno, e nem mais de todo adormecidos. Um abraço suave desperta o fogo ainda não apagado e, envoltos pelo cúmplice murmurar da chuva, entoamos juntos o cântico de louvor aos deuses do amor.
Vale do Paraíba, tarde do último Sábado de Março de 2009
João Bosco