Lágrimas de Vidro III
Não sentia meu corpo.
Apenas minha mente fluía agora.
Deixar Alice fora uma tarefa dura e ingrata.
Senti-me irritado.
Como se pode deixar alguém como ela?
Deveria ter lutado mais.
Ela não merece a solidão.
Não merece essa tristeza.
Quero estar lá para enxugar suas lágrimas.
Mas parece que nada me resta a não ser
Essa eternidade de nada.
Eu e meu amor para sempre perdido.
Um amor.
Minha vida se resumia a ele.
Agora que esta vida acabou, que me resta?
Reflito.
Não pode ter acabado.
Não pode ser isso.
Esse não pode ser o fim.
Choque.
Levo a mão ao peito.
Uma dor aguda e forte no coração.
Percebo que não vejo nada,
Não vejo minha mão.
Outro choque.
É como uma espada medieval
Atravessando meu coração.
Eu grito de dor.
Sinto minha garganta doendo com a força.
Outro choque.
A espada é torcida.
Agarro com força o lençol da maca do hospital.
O tecido sedoso se enrosca em meus dedos.
Ainda está escuro.
Ainda estou gritando.
Outro choque.
Uma voz doce fala alguma coisa
Em tom de preocupação.
Outro choque.
Agora a dor foi mais real,
Como um soco no peito,
De dentro para fora.
Outro choque.
A pancada de dor veio com um clarão de borrões.
Pessoas talvez.
Escuro mais uma vez.
“Aumenta!” a voz doce insiste.
Outro choque.
Sinto minha coluna se contrair,
A dor é seguida de uma imagem nítida.
O teto do hospital.
Um “i” cortado e quieto indica meu coração batendo.
“Ele voltou.” Relaxa a voz doce, com um sorriso sonoro.
Respiro fundo, sentindo o ar voando para dentro dos pulmões.
Relaxo os dedos, sentindo o sangue correndo entre eles.
Sinto o suor na testa.
“Respire.” Diz a enfermeira.
Reconheci sua voz melodiosa e doce.
Obedeci, reaprendendo a respirar.
Estava vivo.
Meu coração pulsava forte, doendo.
Mas era uma dor boa.
As pessoas que me cercavam,
Todas ajudantes,
Começaram a se dispersar.
Então vi Alice com o rosto grudado no vidro da porta.
As mãos pressionando o vidro, tentando atravessá-lo.
Estavam lá ainda as lágrimas na pele rosada.
Mas seu amor continuava explícito em seu sorriso largo,
E no brilho de seus olhos verdes.
Era minha vez de chorar.
Aquela lágrima travada saiu silenciosamente.
Em um movimento labial exagerado,
Disse-lhe “te amo”.
Com emoções a flor da pele,
Chorou mais uma vez,
Transbordando de felicidade.
Deixei minhas emoções rolarem,
Afinal, só tinha em minha cabeça uma imagem.
A imagem que no momento era a descrição perfeita de felicidade.
A imagem que era urgente.
Que era, acima de tudo, bela.
A imagem de quando Alice devolveria o amor que deixei em seus lábios.
Jack