Lágrimas de Vidro II

Quando a morte é iminente, você pensa em certas coisas.

Mas é difícil focar em uma só.

Você acaba abraçando aquela mais próxima,

A mais forte,

A mais intensa.

No meu caso, a mais próxima é a garota de olhos inchados

Ao lado da maca do hospital onde estou.

Já me despedi uma vez. Seria doloroso fazê-lo novamente.

Quando parti para longe, para o outro lado do mundo, foi necessário.

Será que depois disso irei para outro lado?

As sensações se repetem.

- Não quero deixá-la. – eu quase digo.

Mas da última vez, isso só piorou tudo.

As lágrimas de vidro machucaram atrás dos olhos.

Alice pintou a cabelo, mudando do ruivo para um laranja com mechas claras.

Disse que havia desfiado as pontas.

Em nosso reencontro, quando ambos completamos vinte anos,

Disse-me que nunca na vida estivera tão feliz.

- Idem. – era algo que eu dizia muito. Somos muito parecidos.

- Me beije. – ela disse naquele primeiro beijo.

Lembro que estava ansioso, por poder beijar mal.

Mas quando seus lábios tocaram os meus,

Esqueci a razão de nunca ter feito isso antes.

São muitas memórias, muitas emoções,

Muitas sensações, muito amor para uma vida só.

Me restavam apenas três palavras para uma despedida decente.

- Eu te amo.

Alice chorou.

Apoiou a cabeça na maca, soluçando histericamente.

Queria que houvesse uma forma de facilitar para ela;

Sempre me preocupo mais com ela do que comigo.

Minhas forças estão se esvaindo.

Não teria o suficiente para falar que ela deveria seguir a vida,

Que sempre seria a que mais amei,

Que foi a que fez minha vida perfeita.

Queria poder dizer que era a garota mais linda, só mais uma vez.

Que sempre fora a garota que aparecia em meus sonhos.

Que sempre foi em quem mais confiei.

Espero que alguém diga essas coisas por mim.

Alice laçou-me num abraço apertado,

Sua bochecha rosada e úmida de lágrimas encostando nas minhas.

Seus olhos verdes fitaram fundo nos meus.

- Até mais. – sussurrou, com sua voz suave e cristalina,

Quebrada por uma respiração instável.

Eu precisava de forças.

Apenas o necessário para palavrinhas significativas.

Senti não energia, mas a vida fugindo de mim.

Não.

Ainda não.

Respirei fundo, sabendo que seria meu último esforço.

- Até mais, Alice. – foi o que consegui sussurrar em seu ouvido.

Ela beijou-me com paixão por uma última vez.

Então relaxei.

Quando Alice se distanciou,

Levara meus lábios com ela,

E meu amor estaria para sempre explícito em seu sorriso.

O único som era um agudo e contínuo “i”,

Que indicava meu coração parado.

Parado ou não,

A marca de amor deixada nele era eterna.

Jack Lopes
Enviado por Jack Lopes em 08/08/2009
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