E, de repente, o amor
Quem disse que esse sofrer não faz parte do amor?
Se amar fosse assim tão fácil...
o mundo seria o lugar mais chato que existe.
O legal é estar querendo mais e mais.
Talvez para descobrir que o que temos é melhor,
ou pior, sei lá, quem vai saber...
Sou da opinião de que devemos lutar pelo amor.
Mesmo quando ele cai na rotina, tudo no seu lugar,
Acaba ficando mesmo assim, não tem jeito,
as relações têm uma tendência a se acomodarem...
Por isso iremos atrás de um novo amor?
Ou pensaremos bem, analisaremos
e acabamos dando uma escapadinha?
Sei lá, eu sou o maior enigma do amor.
O amor me moldou de um jeito diferente do que eu era
O amor me disse coisas que não eram o que eu pensava
O amor me constipou de uma gripe incessante
O amor me cobrou dívidas que nem desconfiava
O amor me modificou totalmente
Sou outro depois do amor
Sou um outro eu que nem conhecia
Sou um pinguim de geladeira na estante da casa
Sou uma planta a enfeitar a sala
Porque eu nem quis amar desse jeito
Eu nem sabia que a dor de amar doía tanto
Se eu soubesse fugiria rapidamente
Porque eu queria apenas cantar
Sem me importar de ter plateia
Porque eu achava que amar era ser apenas
Puramente e só feliz a todo momento
Não me contaram que o amor machuca
Não me contaram que o amor faz chorar
Não me contaram que o amor traz desconfiança
Não me contaram que o amor trai
Seu eu soubesse de tudo isso
Talvez eu...
não amasse...
não quisesse...
não sonharia acordado...
não ficaria ao lado do telefone...
não esperaria a noite chegar...
não acordaria de súbito na madrugada...
Mas, seu eu soubesse disso tudo antecipadamente...
Ainda assim eu continuaria amando
Ainda assim eu buscaria o seu beijo
Ainda assim eu contaria as minhas histórias
Ainda assim eu me dividiria em dois
E seria meio eu, meio você
Na hora em que você precisasse
Quando me chamasse
Eu me esqueceria de mim mesmo
E romperia todos os recordes de velocidade
Venceria todos os tabus e preconceitos
A razão de minha vida é amar
O único motivo de eu estar aqui é o amor
E por mais que sofra
Voltarei a amar
Continuarei amando
E amarei pelo tempo que ainda me resta
Não me conheço sem o amor
E com ele não sei quem sou
Talvez eu não seja ninguém
Sem a máscara do amor
Que me esculpe da sua melhor maneira
E me traduz fielmente
Muito embora, nem muito fiel, às vezes, sou!
Poesia do livro Viver: um jogo perigoso, de Márcio Martelli, Editora In House (2009).