Veneno amado

Que veneno provaste por alheio paladar

que, achando-o bom, me ofereceste

e eu morri por ti, livre de medos,

ressuscitando o avesso deste verso calado?

Se há mesmo veneno em tuas palavras,

meus ouvidos são ególatras mortos

que atiçados por desigual ousadia,

cantaram em teus lábios alguma agonia

e decidiram morrer-me em ti do mundo separado.

Um peixe dorme no alto da árvore,

desafiando um amor que não nos serve

e um beijo que morto inda mata.

Amanhã eu dir-te-ei do ontem,

quando a lua for a ponte entre o meu céu e o teu inferno.

Qual veneno provei do teu beijo,

tu, ó fada indigesta, mísera invenção

que, além de amar-me, deu-me a sedução

e seduzido continuo a morrer vivo em teus braços.