Por não saber Ficar... *
Elas viajavam em lombos de barcos
E burros à velocidade da escuridão
Porque os recursos eram muito parcos
Aos nobres carregadores de solidão
Que para unir as Almas se doavam
Tomando para si as penas dos sozinhos
Muitos as próprias vidas entregavam
Para unir os humanos caminhos
Ah! Como essas Cartas eram belas
Que viajavam entre os matos e feras
E apesar dos meses de demora delas
Nem eram tão longas as esperas
Levadas pelos Ginetes e Barqueiros
Ambos cumprindo a missão de Carteiros
Nos papéis de veículos e Condutores
Levavam esperanças de eternos Amores
Hoje elas não vivem mais as Cartinhas.
Escritas sob luzes de velas bruxuleantes
À mão e penas nem que fossem de galinha
Derramando as ânsias dos Amantes
Essas Cartas nunca eram mentirosas
Porque as caligrafias poderosas
Denunciavam através dos traços
E da uniformidade dos espaços
Além da profundidade das palavras
E pela musicalidade em mil oitavas
A firmeza e a verdade dos propósitos.
Dando fé à sinceridade dos depósitos
Que traziam as palavras dependuradas
Nas linhas dos coloridos varais vocabulares
Que eram deitados nas gavetas seculares
Roupas das Almas elas dormiam amareladas
Ah! Como eu gostaria de poder voltar
Àquele tempo em que se sabia Amar
Fugindo das luzes iludidias do ficar
Que nos deletam antes de salvar.
Como me deliciaria confessar à minha vida
Não através desta pena que pinga letras de dor.
Mas sim por uma de Condor pena perdida
Que emprestasse asas à minha Cartinha de Amor
Pois hoje apesar de contarmos com mais dedos
Mulas e barcos diferentes que chegam mais cedo
Pelos Carteiros que viajam à velocidade da luz
Para receber uma resposta é uma verdadeira cruz.
Será que os avanços do conhecimento
Que seriam para avivar os sentimentos
Servem para das máquinas nos aproximar
E de nós mesmos humanos afastar?
Será que o Amor está para sempre extinto
E este sentimento anacrônico que sinto
Não encontrando mais onde se agasalhar
Terá que partir por não aprender a “ficar”?