Sem Razão para Ser Feliz
 
No passado houve
tantas palavras a iludir...
Mas de tanto atirá-las
como desprezíveis projéteis,
hoje parecem carecer de letras,
estão áridos de emoção.
Na ilusão que faz
com que a posse pareça
afetuosa paixão,
criaram engenhosas mentiras,
tão convincentes quanto fúteis.
Na insanidade da auto-estima
ergueram pirâmides
no deserto da consciência.
Travestiram-se de poderosos titãs, 
adornaram-se de pseudo-atrativos.
Enganaram a todos e a eles mesmos,
criaram armaduras
para se proteger da solidão.
Enormes muralhas emocionais,
como que uma toca
onde se recolhe um animal ferido.
Lá dentro o dissimular da dor,
o temor de que o grito
denuncie o estado vulnerável.
Vítimas de sua auto-impiedade,
não desejam contar
com a piedade alheia.
Numa atitude defensiva,
querem mostrar que a ferida
é menos profunda do que parece.
Fosse possível,
criariam convincente representação,
fingiriam com indiferença
 nada ter acontecido.
A questão é que estão
como um vaso quebrado,
 uma imagem de muitos cacos.
A ausência de solução
não é opção, mas conseqüência
puramente indesejável.
Divididos em muitos sentimentos
falta-lhes a motivação
que os unifique.
Veem-se como
um amontoado de escombros,
como um acidental quebra-cabeças.
Cheios de morbidez quase suicida
se atiram um ao outro
para livrarem-se de si.
Questionam-se,
estando no fundo do poço, 
se seria possível
afundarem ainda mais.
A falta de perspectivas
esvazia os corações
das suas tolas
e ilusórias esperanças.
Toma-lhes de assalto
um realismo cheio
de inflexibilidade e amargura
tão ruim que, pior, parece ser impossível ficar.
Assim é que a falta de possibilidades
cria novas expectativas.
É como uma semente
de sonho bom
que nasce em meio
a um insólito pesadelo.
Encontrando o chão
não resta senão tomar novo impulso
para retomarem a vida.
Opção por um heroísmos estóico,
tentativa de sofrer
 com alguma dignidade.
Não desejando
as vestes de masoquista,
mas tentando encontrar
alguma luz no sofrimento.
Cheios de boas intenções,
mas tendo dificuldade
em vencer o impulso autodestrutivo.
Pura zombaria,
deixam a imaginação delirar,
veem-se como injustiçados
e atraiçoados.
Projetam-se como infelizes vítimas, 
 dissimulam a raiva
demonstrando compaixão.
Emoções se desarmonizam
com pensamentos,
não conseguem realizar
aquilo que projetam.
A inquietação psíquica
se somatiza em dores reumáticas
por todo o universo físico.
Uma teimosa prostração,
o pavoroso medo
de se erguer para cair novamente.
Imobilizados,
querendo reagir a todo custo,
mas temerosos com o resultado
da própria ação.
Vendo-se na metafórica imagem
de estarem sobre uma corda bamba,
prontos para cair.
Relutando numa resposta,
mas sendo fortemente pressionados 
pelo instinto de conservação.
Fosse o temor da dor,
talvez não desejassem correr risco,
 mas é impossível não se arriscar.
Melhor a probalidade
entre a vitória e a derrota
do que a inércia na vida.
Abrem, então,
um tímido sorriso nos lábios,
dão umas chibatadas
no orgulho e na vaidade.
Reconhecem que chegaram ao fim,
em meio a lágrimas 
riem-se do tamanho
das suas mágoas.
Sentem o sabor
da nova possibilidade.
Despedem-se um do outro,
 dão as costas,
seguindo, a partir daí,
caminhos em direções diferentes.
Gilberto Brandão Marcon
Enviado por Gilberto Brandão Marcon em 07/05/2009
Código do texto: T1581426
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