SOLIDÃO DE TI
SOLIDÃO DE TI
J.B.Xavier
Chegamos juntos ao porto, onde nos aguardava
O veleiro da ousadia e da aventura, e eu ansiava
Por dançar contigo em seu convés o sublime bailado
Que nos colocara nesta viagem, assim, lado a lado...
Enlacei-te a cintura, naquela tarde de perfeita calmaria
Na loucura leniente que a doçura de teu sorriso me trazia
E baixamos as velas, dando início ao nosso navegar
Para as conquistas que eu ansiava por te presentear...
Lançamo-nos ao mar bravio das ondas revoltas
Certos de que deixando as velas soltas
Atravessaríamos o oceano de toda vicissitude...
E nos esquecemos de que o tempo nos ilude
Com promessas inverossímeis e doces acalantos
E ao invés de risos, oferece-nos prantos
Com os quais temos que aprender a conviver
A voar, a cair, a levantar, a sorrir e a sofrer...
E seguimos pela vida, como incautos navegantes
Olhando para a eternidade, sem ver os instantes
Em que a felicidade passou por nossas velas
Como rápidas gaivotas, ou como brisas singelas
Sem que dela fizéssemos caso,
E seguimos a rota do acaso,
Em direção ao oceano profundo, e sem olharmos em torno,
Seguimos celeremente até que já não houvesse retorno...
Não foram poucos os avisos de perigo,
Como os momentos em que deixei de estar contigo
Ou as tormentas onde larguei o timão
Às expensas das delirantes trilhas do coração,
Ou por olhar demais para minha própria imagem
Refletida nas águas do mar - estúpida miragem
Que insisti por tanto tempo em admirar
Até que te distanciaste e não pude mais te alcançar...
Mas seguimos mesmo assim, aos poucos transformando
Em pesadelos os sonhos que fomos sonhando…
Não olhamos para o céu iluminado a nos abençoar,
Nem para a canção da felicidade que ele estava a entoar...
Nada significou quantas e quão belas
Foram as paisagens que conhecemos, ou quão singelas
As praias maravilhosas em cujas areias pisamos
Nos momentos fugazes em que verdadeiramente nos amamos...
E um dia o navio dos nossos ideais mergulhou na escuridão
De mil tormentas, para as quais nem o teu nem o meu coração
Havia se precavido, ainda que todos os avisos
Tenham nos sido sinalizados pela falta de nossos sorrisos...
Ainda assim não vimos os recifes pontiagudos
Ou se os percebemos, acreditamos serem veludos
Que adornavam nossos horizontes
Sem perceber a tormenta que rugia por trás dos distantes montes...
E um dia descobrimos que estávamos cada qual em seu navio
Singrando rotas diferentes, sem cargas de esperança, vazio
De nossas grandes intenções, quando partimos...
E mesmo assim, entre risos acanhados e risíveis desculpas, fingimos
Que estávamos ainda a navegar os mesmos destinos...
E descobrimos que éramos apenas pobres clandestinos
A perturbar o avanço da embarcação,
Ainda que eu continuasse a ter ofertar meu coração...
Finalmente, adormeci os sonhos cansados,
Sonhos que apenas contigo faziam sentido serem sonhados,
Realidades que construí com quimeras e promessas
Que apenas a ti foram confessas...
Então o sol se foi, e sobreveio a tenebrosa escuridão
Na qual, já sem esperanças, submergiu meu coração,
E mergulhei no mundo sombrio da solidão de ti...
E quando acordei, só, na imensidão do oceano, já não mais te vi...
* * *