O PORTO
( Herivaldo Ataíde - 2001)
EU A VEJO POR ENTRE AS GRADES.
GRANDIOSA E CLARA SOBRE TUDO.
UMA REDE SE ABRE PERFUMADA
ME LEVANDO E LAVANDO A ALMA,
PURIFICANDO MINHA CARNE,
TORNADO-ME TRANSPARETE
FEITO A TUA FACE LUNAR.
TEU GRANDE OLHO BRANCO
NÃO ME PERDE NUNCA.
MESMO POR ENTRE AS ESTRELAS
OBSERVA-ME POR TODA NOITE,
ILUMINA MEU ÍNFIMO MUNDO
ATÉ SE TORNAR INVISÍVEL
NAS HORAS DO DIA SEGUINTE.
TUA BOCA LIMPA ME BEIJA
COM A IMENSA LINGUA MOLHADA
ENCHENDO E DEPOIS SECANDO
MEU CORAÇÃO GRANULADO,
FEITO DE CONCHINHAS BRANCAS,
PEDAÇOS DE TANTOS SONHOS
QUE SE PERDERAM NO TEMPO.
TEU SOPRO ENCANTADO
É FEITO DE VÁRIOS SONS
DE GOZO, DE BEIJOS E GRITOS.
DE CHORO, SILÊNCIO E RISOS.
TU PERMANECES CONSTANTE
POR ENTRE AS PALHAS VERDES
E SUAS DERIVAÇÕES DE TONS.
COQUEIROS MISTERIOSOS BALAÇAM
DE UMA LADO AO OUTRO DA VIDA
COMO QUEM NADA PERMITE,
NEM MESMO SABER DOS AMORES
ENTRE OS HOMENS E OUTROS PEIXES
QUE POVOAM SUAS RAÍZES
DURANTE ANOS ETERNOS.
TEU CORPO É TÃO ARENOSO
DE SABOROSOS SABORES.
ÉS FRUTA QUE NÃO SE VENDE,
SE ESCONDE POR ENTRE O PEITO
ATÉ QUE SÓ SOBRE A SAUDADE
DOS DIAS EM TI VIVIDOS
EMBRIAGADO DE AMORES.
TEU VENTRE É UM PORTO PERFEITO
FEITO DE PEDRAS E RUAS,
DE NOITES E CAMINHADAS NUAS
POR ENTRE AS PALHOÇAS DESERTAS
ONDE OS AMANTES SE ENTREGAM
SEM MEDO DAS CONSEQUÊNCIAS
DE OUTRAS NOITES SEM LUA.