À deriva

Há ainda a vida

E nenhum sinal de interrupção no horizonte.

Nenhuma embarcação armada, nenhum pirata, nenhuma barreira.

Ainda há a vida e o mar – grandes, porém finitos.

Há ainda o tempo de navegarmos juntos, lado a lado,

De qualquer modo.

E esse tempo ainda não vislumbra o seu final.

E o som das ondas batendo ainda é para mim como a sua voz.

E não quero que deixe de ser.

Há uma subjetividade sensível e uma sensibilidade subjetiva

Entre nós há nada e tudo.

Há uma linha breve e indistinguível.

Que pode significar qualquer coisa.

Ainda não somos ruínas de uma cidade engolida pelo mar.

Ainda não somos o último vestígio da existência de um mundo.

Ainda somos, um para o outro, duas imagens refletidas.

Duas sombras esquecidas no turvo oceano.

Mas estamos juntos.

Somos dois náufragos ao sabor do vento e do sal.

Tendemos a girar.

Infinitamente. Indefinidamente.

Ainda somos incógnitas. Mudanças de maré incoerentes.

Conseqüências do olhar da lua.

E assim seremos, por um tempo indeterminável.

E o sal não há de arrancar meu nome da sua boca.

Nem o seu da minha.

Ainda guarda, para meus sentidos, todos os mistérios do oceano

Ainda guarda, para meus braços, muito tempo.

Ainda guarda, para os meus olhos, muito gosto.

E acho que nós somos algo de errado, ou de tão certo que nem sabemos o que é.

Amanhã saberemos.

Ou depois.

Ou nunca.

Há ainda o tempo.

E não há quem o pare.

E não há como voltar.

E não há como correr.

Então sigamos.

Sigamos à deriva... sem rumo... sem norte

Nosso alvo? O mais sincero e merecido fim.

O invisível por trás do horizonte

Onde ninguém foi. Ou para onde todos acabam indo.

E ainda haverá a vida depois disso.

Independente desse nosso último ponto.

Sigamos, à deriva,

Ao indecifrável.

Joao L Terrezo
Enviado por Joao L Terrezo em 26/04/2009
Código do texto: T1560275