O Menino que há no menino

Edson Gonçalves Ferreira

Acabava de gravar "Quem sabe", de Carlos Gomes

Minhas amigas sairam e, de repente, vi o Menino

Ele estava quientinho na varanda

Cheirava as folhas de erva-cidreira

Perguntei-Lhe o porquê não entrara

Respondeu-me que ouvia as canções de lá

Que queria ser visto só por mim

Fiquei no ar

Explicou-me que eu O vejo, porque há uma criança acordada em mim

Fiquei feliz e o Menino sorriu

Interroguei-O se não estava preocupado em morrer na Cruz

Nada -- retrucou-me -- isso aconteceu há dois mil anos

Hoje, estou mais preocupado com os que são crucificados agora

O sistema capitalista selvagem prega muito mais gente na cruz

Coloquei as mãos no queixo e Ele sorriu e disse:

Essa posição Ziraldo fica muito bem em você

Entendi que se referia à caricatura

Ziraldo me eternizou com a mão no queixo

Ele, agora, estava escutando as gravações que fizemos

E , então, me perguntou: _ Essa música de Carlos Gomes é triste, né?

Sim - respondi - sentimos muitas saudades de quem parte

Saudades de quem está distante

O Menino saiu do escritório correndo e voltou

Trazia nas mãos um ramo de erva-cidreira

Passou o ramo no meu rosto e disse

Sinta o cheiro dessa planta

Ela não lembra a terra

A terra é o nosso berço

Nela renascemos quando acreditamos que o Pai zela por nós

E, gentilmente, apontou para o retrato de minha mãe

Sua mãe já partiu, mas está, agora, aí do seu lado, poeta

Assim, aquele poema sobre o medo que, para você, é o monstrengo

Ele é lindo, mas o medo é algum comum ao ser humano

É preciso ter um coração puro como de uma criança para caminhar

Você faz isso muito bem

Por isso, visito você

Não se esqueça de que volto quando menos você esperar

Quando eu ia responder alguma coisa

O Menino tinha desaparecido

Só um perfume de rosas pairava no ar.

Divinópolis, 07.04.09

edson gonçalves ferreira
Enviado por edson gonçalves ferreira em 07/04/2009
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