ausência
Eu sinto um beijo quente enquanto eu durmo
Um toque molhado junto da minha boca
Uma voz suave, nada sensível
Nada rouca
Quase nula, quase fina, quase louca
Eu vejo um gesto escuro enquanto fecho os olhos
Como um quadro móvel preso nas minhas pálpebras
E sua mão desenha-lhe contra meu rosto
E se derrete, se desmalta, se defaz
Eu sinto um suspiro perpassar meus músculos
Perpassar doce minha nuca, meu cabelo
Penetrar tímida na minha pele, nas minhas narinas
E me encher de paz e vida: de você
E a minha sombra projetada na parede
É a companhia, o contraponto do seu corpo
E tão sozinho, tão vazio, tão poeta,
O corpo é nada, é decomposto
Segura os dedos. Segura a minha mão de novo
Sinto-me leve, descarado
É submisso, é descontente, é solitário
E é tão inconstante que nem me permite métrica
É tão funesto, é tão triste, chega a tétrico
E faz das muitas boas palavras apenas letras
Eu sinto aqui uma pavorosa descrença
Insegurança, medo, não sei mais o que
Eu sinto aqui, junto a meu corpo uma presença
É o que esconde a ausência de você