O disfarce das palavras
Tento disfarçar a dor que sinto,
na arquitetura do poema,
na construção do verso.
Disseste não poder viver dividido,
quando em mim o reflexo
de tua partida
causa dano e abandono.
Queres um recomeço, pedes que
viremos juntos a página que
foi tecida com nossas mãos,
na encruzilhada de um caminho
agora desfeito, no rascunho
de um desejo incontido.
Tuas palavras não me consolam,
teus votos de que eu fique
bem não me convencem.
Há, em mim, nesse momento,
apenas tu e o que a vida
teceu em alguns poucos encontros.
Não é fácil virar a página escrita
com o suor do desejo,
com as lágrimas da despedida.
Tens razão quando dizes
serem teus problemas infinitos
perto dos meus, mas a paixão
desconhece os descaminhos
do cotidiano e tua necessidade
contradiz o que sentes.
Não preciso da metáfora
quando teu discurso usa a
literariedade das
palavras cruas e precisas.
Preciso ainda de ti, mesmo
sabendo ser impossível minha
vontade, ser inútil dizer-te sim.
O disfarce das palavras usa a
máscara do poema para
deixar exposto nos fios
entrelaçados desses versos
que a paixão que sinto
é um complexo teorema.