O Menino e a enchente e o poeta
Edson Gonçalves Ferreira
Dormi preocupado
Chovia muito e já sabia da inundação
Acordei com a sensação de algo molhado encostado a mim
Abri os olhos e o Menino estava na minha cama
Sua camisola azul, bem azul estava molhadinha
Adivinhei na hora de onde Ele viera
Ele estava com os olhos cheios d´água
Não perguntei nada
Ele me contou, então, que a enchente é a conseqüência
A consegüência da falta de amor entre os homens
Entre os homens e entre os homens e a Natureza
Eu ouvia tudo silenciosamente
Ele falou que sabe do meu trabalho nos jornais
Sempre combato a invasão das áreas de preservação ambiental
Sou uma pedra no sapato dos políticos que lavam as mãos
O Menino contou-me que, quando era criança, a chuva não fazia isso
Também não havia tanto asfalto
Também não havia tanta ganância para construir arranha-céus
Ele falava, falava, falava...
E enquanto Ele falava sua roupa secava
Eu estava de bruço, segurando o queixo com uma das mãos
A visita privilegiada me encanta sempre
Depois de contar as novidades, o Menino saltou da cama
E, pluft, desapareceu
Só ficou um perfume no ar.
Divinópolis, 18.12.08