O pensamento voa...
I
Nestes momentos, em que a tarde morta,
Traz lembranças jamais olvidadas,
Ouço bater de novo à minha porta
Palavras de amor, com as quais tu me brindavas...
Mas eu afasto este pensamento,
Porque a vida é um andar pra frente!
Já cantei demais meu sofrimento!
Agora impõe-se que eu a ti enfrente!
Ainda há tempo para ser eu ser feliz
Para ter a vida que eu sempre quis,
Basta para isso esquecer passado...
Mas lá no fundo de minh’alma triste,
Eu não esqueço o modo como tu sorriste
Quando disseste: Há muito eu já te amava!...
II
E fica o vôo do pensamento livre,
Truncado pela saudade, sem se libertar,
Lembrando os sonhos lindos que eu tive
Quando em meus braços, estavas a me amar...
Esconderei essa tristeza, “via dolorosa,”
Nas cavernas mais secretas de meus versos
Sufocando a lágrima que, muito teimosa,
Faz voltar amados sonhos, adversos...
- Solta-me! Livra-me destas amarras!
Como fantasmas, abrem suas bocarras,
Querendo me atrair pra sua mansão!
Eu fui feita pro amor! Sou alegria!
Quero viver sem esta nostalgia!
- Verás: eu me soltarei de tua mão!...
III
Cabeça erguida, olhar sempre adiante,
Eu terei sorrisos em meu rosto triste!
Serei talvez a Musa radiante
De outro Poeta, como jamais viste!
Encerro o luto! Já durou demais
Este lamento! Eu hei de viver!
E estarei linda! Serei sempre mais!
Pois os sonhos tristes quero esquecer!
Ainda há sol! E há belas madrugadas!
Tenho muita vida; pra viver encarcerada?...
Tenho muito amor guardado dentro em mim!...
Rejuvenesci com esta decisão!...
Não mais aguardarei tua indecisão!
E libertei-me então, para sempre, enfim!...
IV
Aguardo agora as cantigas novas...
Teço em ouro um imenso véu...
Perfumo o corpo com pétalas de rosa
De sândalo puro meu leito se reveste
E perfuma... Lençóis de cetim!...
Minha camisola é feita de luar
E mil estrelas cobrem-me a fronte
Em diadema... E eu vou cantar!...
Meu canto é feiticeiro, como o das sereias,
É feito de atração! Mas não para enganar!...
Cabelos ruivos com pente de diamantes
Sedosas mechas irão acariciar...
Meu canto e meu perfume, onde estiver,
O Eleito de minh’alma, vai ouvir, notar!
E virá sedento desta Esperança,
Para, em meus braços, ternos, se aninhar!...
Meu manto de ouro cairá dos ombros...
E a camisola, feita de luar,
Será o tapete, onde irá pisar...
O perfume de rosas, amalgamado,
No sândalo amadeirado vai ficar...
Serão perfumes e serão sussurros
Na noite morna em que vamos amar...
Depois, Pégasus virá lá das estrelas,
Em seu tropel alado a nos carregar!
As janelas se abrirão de par e par
E iremos juntos, na noite, cavalgar!...
Desceremos na relva orvalhada...
E no seu colo vai me carregar;
E, lentamente, me porá deitada,
Junto ao lago, que de estralas, ‘stá a brilhar...
E nos fundiremos como um grande “UM”...
E relva e lago vão se orgulhar
De tanto amor assim presenciar...
V
- Vês porque não posso te esperar?...
O pensamento livre voa... E sonha!...
Posso eu tais sonhos vir desperdiçar?...