O eterno e o passageiro

Muitos sonham com o amor eterno,

aquele que permanece a vida toda.

Aquele vai acalentar as horas dos dias e noites,

que vai aquecer os pés e as orelhas

que vai estar sempre disponível,

para alcançar a lua e as estrelas.

Então de tão certinho que é,

não alimenta mais as fantasias,

o imaginário deixa de reinventar,

a mesmice se instala,

a cegueira entorpece,

o coração não mais trepida,.

as mãos não comparecem

e apenas o relógio marca as horas do dia,

num compasso sempre rotineiro,

assim como o amor se tornou,

tão certinho e acomodado

que ninguem percebeu.

E um dia de repente,

os sonhadores do amor eterno,

descobrem que as suas distâncias

são superiores a de um corpo

que deveria encaixar-se como concavo-convexo.

As buscas existenciais e prazerosas

se tornaram duas paralelas

que nunca mais, em tempo algum

irão se encontrar de novo,

e as criaturas, de costas uma para a outra,

experimentam a sensação do vazio,

embora estejam perto.

E o susto é tamanho, com a desproporção desvelada,

que a aceitação leva um tempo.

Contudo assim como num compasso de valsa,

há o ritmo, a pausa e o compasso

no utópico amor eterno,

há um ritmo que se perdeu no tempo e na memória,

uma pausa que se tornou difusa, descontinuada

e um compasso que desacertou há tempos,

a dança dos dias e noites

em que a musica do amor

era ouvida por toda a vizinhança,

que curiosa agora pergunta:

- O que foi feito daqueles dois

que sempre parecerem ser

apaixonados eternos?

E uma esperta borboleta azul responde:

A eternidade está a um passo

de se tornar passageira do tempo,

sempre que o amor e a paixão se tornam

partes e não o todo dos amantes.

Sempre que eles se esquecem de regar a plantinha,

cultivando a terra, adubando com carinho,

retirando as ervas daninhas do tédio,

e acima de tudo deixando a frágil plantinha

sob o sol do cuidar constante,

com desvelo, mimos e afagos.

Quando os corpos não mais se atraem,

os beijos não tem o sabor de quero mais,

os abraços não são tão fortes,

não se ouve a batida do coração do outro,

em uníssono com a nossa,

e os enlaces tornam-se frouxos o suficiente

para caberem outros devaneios

e fantasias extemporâneas.

E assim, nem mais nem menos,

os amores eternos se decompoem

nem sempre tão calmos e serenos,

mas de estupefata conclusão se dispoem.

Num derradeiro gran finale valsante,

cada criatura silente toma o seu rumo,

na liberdade cada qual torna-se viajante,

que busca entender o passado num resumo.

"Nada é eterno, tudo é passageiro"

Santos, SP-03/03/06

15,20 hs

Guida Linhares
Enviado por Guida Linhares em 03/03/2006
Reeditado em 10/03/2006
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