MINHA PAISAGEM

Minha paisagem

um pássaro

pousado no ar

entre dois rumos

de partir

de voltar

A noite

que guarda uma estrela

para além do céu visível

acessível

através das veredas

que o silêncio abre

Um beijo

que ensaia o vôo

no espaço difícil

que se reinventa aos poucos

através do sonho

onde as flores

se esqueceram de nascer

mas ainda aguardam

possível primavera

A música

que existe sempre

mesmo quando as bocas

já perderam a lembrança

do gesto de cantar

Eu mesma

o espaço que me abro

para uma outra

que fui

e ficou esquecida

entre os descaminhos

as perdas

as florestas do não-ser

A esperança

de aprender a olhar

o dia de frente

e recolher o dia

no côncavo das mãos

depois soltar o dia

para que ele se espalhe

pelas árvores de dentro.

Do livro inédito CRAVO VERMELHO TERNO BRANCO, de 1991.