PAIXÃO INSONE

O telefone chama

Ouço o toque do outro lado

Enquanto meu peito reclama

O som da tua voz.

No vago silêncio da noite

A voz mecânica diz

Que seu telefone foi desligado

E que, se quiser, posso deixar recado.

Ela está dormindo, penso

Se penso, existo cartesianamente

Duvidando do amor e de tudo

Estou sozinho, percebo

Não quero o frio da carência

Prefiro a febre da paixão.

Meus olhos se abrem

Vagueiam noctívagos cor de mel

Há uma tela escura

Na madrugada do meu quarto

Vejo em close a tua tez morena

Um brilho vasto de um sorriso largo

Acordo quase sobressaltado

Nos olhos a visão

De um sonho interrompido

Na boca um gosto de beijo

Atirado ao vento

Como a semente que voa

Em busca de solo fértil.

O instante do teu sorriso

Que a fotografia congelou

Eu o recolhi pra mim

Sem te pedir licença.

É crime, eu sei, eu o cometi

Sou réu-confesso, mas não me corrijo

Não o devolvo

Guardo comigo

Como se minha propriedade fosse

Furtei o instante congelado do teu sorriso

E o mantenho guardado comigo

Onde só eu posso vê-lo e revê-lo

A qualquer momento.