A uma indigente
E aquela menina que vi passar,
Na manhã fina de sol escaldante
Tão feia, cujo traje que surpreende
O mais rústico ser da nossa terra.
Uma calça de abrigo, todo encardido,
Que por emendas cobria suas pernas,
Tão rarefeito e desbotado era seu linho,
Supostamente uma peça usada da infância
Que sobrevivera em seu corpo mal crescido.
Uma camisola não menos cafona,
Cobria a pele morena da menina.
Desajeitada, suja e maltratada
Como os pombos daquela praça;
Ostentava os sapatinhos úmidos, em grossos defeitos,
Em pés não mais nobres do que os de uma pedinte;
Ao menos combinavam com o marrom da lama
Em que ela despreocupada muitas vezes pisara.
Ao seu lado, o pai da feia moça,
Um homem tanto quanto rude,
Levantou-se, e num breve assovio,
Chamou-a, como se chama a um cão.
Foi então que flagrei, no alto da moça,
Os cabelos castanhos que corriam pela nuca,
E entre eles dois olhos, verdes como a Esmeralda,
Tais duas estrelas de um mundo mágico.
Tinham o brilho fosco, sintomas de tédio,
E de sofrimentos suportados sem mágoas.
De certo perguntava-se, quando via as ricas jovens,
Se sua beleza não seria completa,
Caso tivesse a fortuna delas.
Assim, nossa moça invejava as ricas passantes,
Pelas belas joias e pelas roupas caras,
Enquanto qualquer ser que visse aquele anjo torto,
Haveria de invejar-lhe tão natural beleza;
E numa indiferença, só presente em tais almas
Acostumadas aos maus tratos da vida
Saiu sem dar-se com os meus espantados olhos;
Duas pérolas refletindo a luz do sol,
Como raios se refletem em águas cristalinas.