Malimenca do Avesso
Nunca mais vi o Malimenca, vivendo em distância há anos....
Última vez? Deixei um aceno de mãos
para sua visão captar
entre a cabeleira escura e espessa.
Malimenca é um caso extremo
de homem devoto e calado. Sofrido.
Um relógio não o difere, suíço, sempre de pé às sete.
Na solidão do seu espaço pouco, aquele que lhe cedem,
lava sua louça, sua roupa e prepara seu café,
preto, coado no pano.
Corre todas as datas, na calçada, faça o tempo que for,
cuida dos músculos, seu corpo é seu templo
e este guarda sua alma e salvação,
e religiosamente prepara seu almoço.
Ele é um homem de cozinha.
Malimenca vai ao culto todo sábado a noite
encaixado no seu terno e segurando seus versículos,
como todo aquele que ora não perde a fé numa melhora,
quer deixar de vender latas, melhorar de bicicleta,
quem sabe ser hábil num ofício,
quiçá domar um instrumento e tirar som de suas mãos.
Taciturno, conserta coisas,
panelas, paredes, canos e fiações.
Seus poucos bens são ferramentas.
Malimenca é um homem
que nunca saiu de seu quarteirão
e seu mundo todo é esse quadrado em questão.
Dizem que a ignorância é uma bênção...
abençoado seja o Malimenca.
* Ao amigo de longa data, Érike Marinho