O poema de Penélope

Na Odisseia, Penélope (mulher de Ulisses) pressionada para se casar de novo perante a longa ausência do marido, aceitou casar mas só depois de tecer um sudário, tecendo este de dia mas desfazendo de noite o seu trabalho de dia, procurando assim adiar o casamento o mais possível.

Escrevo vou escrevendo

Tendo guardado um número

Que depois de o atingir

Finalmente te irei procurar

O número de poemas

Que estou sempre a adiar…

Vou escrevendo

E quando me aproximo

Outro número tendo a inventar

Porque embora te ame

Receio o teu olhar…

Não sabendo se este me irá receber

Ou quando olhar para mim

Não me irá ver

E por isso o tal número

Não pára de crescer…

Mas sei

Tal será inevitável

Que um dia

Os números vão acabar

Mas sei também

Que quando for ter contigo

Estarás noutro lugar

E assim tudo se perderá

Porque ao contrário da outra história

Esta ninguém irá contar

Talvez porque o número

Era fechado

Não infinito

A nossa história que ficou por contar

Era vulgar

Tanto

Que nem se transformou num mito, no nosso mito…

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 06/06/2014
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