ESTRATÉGIA SIBILINA & MAIS
ESTRATÉGIA SIBILINA
O vento que revolve teus cabelos
não é o vento que faz flutuar teus dedos,
que te sibila ao ouvido teus segredos,
sem serem teus, de fato, tais desvelos.
Porque esses sonhos que bem julgas tê-los,
são nada mais que mimas*, pelos ventos...
E os cantos que te expressam sentimentos
melhor te fora soubesses esquecê-los...
Todavia, sempre existe a recompensa;
É como se, ao saberes expressá-los,
os teus fantasmas te abrissem os caminhos.
Para que possas, nessa trama densa,
continuar, de bom grado, a escutá-los,
sem te prenderes aos sonhos mais mesquinhos.
* "mimas" são unidades de imitação, o que se vê ou se escuta com freqüência e se acaba por repetir.
GLADIADORAS
Conversa com ti mesma... Segue a alma
por seus meandros que não têm repouso.
Analisa os pensamentos que têm pouso
sobre a consciente aceitação da calma.
Pois tens desejos que nem sequer são teus.
Até parecem, por serem costumeiros:
noite após noite os escutas, derradeiros...
E, na alvorada, ao sol rasgar seus véus,
estão de volta. Mas são predicados
que não pertencem à tua mente mais profunda
e se, para atingi-los, te esforçares,
algo te faltará. São resultados
do raciocínio alheio, que te inunda,
e se desfazem no momento em que os tocares.
sombras quânticas
minhas sombras se entrelaçam no passado:
este sou eu, não sou... como discordam!...
essas penadas almas só concordam
em perturbar-me o amanhã inalcançado.
porque o presente não podem: é marcado
pelas tribulações que, atuais, o abordam,
pelas escassas candeias que se acordam
em murmurar-me um futuro mais dotado.
o que sei é que não vivo nesse outrora,
que já se foi, mas que faz parte de mim
e me criou a interface... tão fluente,
que dizem ser atual, porque é de agora,
e todavia, bem sei não ser assim:
que é meu porvir que escorre permanente.
INDECISIVE SONG XIV
Always accept your mistakes like friends
who came in to stay the closest to you.
Their wish for pleasant remembering stands
and never for punishment mete out anew.
Rather they want to prevent the beggars,
the new mistakes bearing masked faces,
from swindling you with hidden daggers
and leading you astray to dangerous places.
Now trust past mistakes and experiences,
that instructed into your apprenticeship
and helped as well to character-building.
But never put your faith in those appearances
that come to you in false stewardship
so as to allure and dominate your being.
ALFENINS PUÍDOS
EU RECONHEÇO, AFINAL, SER DESONESTO,
COMO TODOS, ENFIM, QUE ME RODEIAM.
COM SEUS SORRISOS FALSOS, PRESENTEIAM
CORDIALIDADES FORJADAS EM INCESTO.
POR MAIS QUE NESTES VERSOS QUE CAMPEIAM
UM SENTIMENTO ALTIVO, OUTRO MODESTO,
QUE ME DESCREVEM ATRABILIÁRIO GESTO,
OU AS CALMAS ANSIEDADES QUE PERMEIAM
MEU RETINIR DO MUNDO, LÁ NO FUNDO,
BEM SEI QUE TODOS OS BELOS SENTIMENTOS
E OS VERSOS DE REVOLTA EM QUE ME ACENDO,
NÃO REFLETEM A MIM: SÃO UM JOCUNDO
RECALCITRAR DE ANTIGOS NASCIMENTOS
DE VIDAS MORTAS, QUE NEM SEQUER ENTENDO.
ALFENINS PUÍDOS II
Ou, quem sabe, não são vidas passadas,
as que me inspiram. Sequer recordações
lembradas nas presentes ilusões,
que rematizam lembranças já trincadas.
Talvez relembre outros de mim mesmo,
que vivem simultâneos, em portais,
que demarcam outros mundos: que jamais
encontrarei. Porque, transpondo a esmo,
são meus colegas de vida, meus espelhos.
Ou quem sabe se não passo de um reflexo
e um outro deles, apenas, é quem vive?
Em tal solipsismo, que seus velhos
anseios de alcançar melhor amplexo
não são os mesmos que jamais eu tive.
PANTAGRUEL
Durante o inverno eu vou beber o sol.
Me alegra o coração, quando ele cresce
dentro do peito e o estômago me aquece
e somatizo-me assim, nesse arrebol.
Mas no verão, não me sinto girassol.
Bem ao contrário, teria, se pudesse,
os céus nublados como em triste prece,
para esconder-me, qual um caracol
prudentemente se enfia em labirinto.
Mas bem sei que melhor seria, então,
que devorasse o sol deste verão
e assim pudesse, como vinho tinto,
embriagar-me num metabolismo
que melhor iluminasse o quanto cismo...
ALFENINS PUÍDOS III
Ventila o vento, em dias de calor.
Se não quer ventilar, o tempo gira
e agita o ar à força, antes que fira
meu próprio coração em tal ardor.
Ventila a vida, em dias de indolor
esquecimento de quanto o mundo mira.
Não que a vida ventilada assim prefira,
mas porque ventilar-se é seu pendor.
Prefiro mesmo que a aridez do estio
seja varrida, até que outro frescor
sobre mim chore e em pranto dê guarida.
Porque assim vejo: são dias que desfio,
em matrimônio com tal ventilador,
que me arrebata os dias de minha vida!
REGRAS DA VIDA XXX
Nem sempre que se faz uma pergunta
se gosta da resposta: mas se sabe.
Dúvida alguma na mente já não cabe,
quando a suposição não mais se ajunta
aos nossos preconceitos e esperanças.
Assim se tornam inúteis nossos planos.
Porque é certo que todos os humanos
coisas diversas desejam por bonanças.
É o que se vê nos negócios, na família,
e nos casos de amor mais desejados.
Pergunte sempre e mude seus projetos.
Antes da caça aos sonhos incompletos,
indague bem de si mesma qual a trilha
a que seus atos vêm sendo destinados.
REGRAS DA VIDA XXXI
Acima de tudo, importa a dignidade
em tudo conservar. Não a honraria
que este mundo confira, mas a que pertencia,
desde o começo, à tua personalidade,
que geraste em ti mesmo. É em tal combate
que a tua auto-estima sobrevive
e o respeito por ti mesmo em ti revive,
a cada passo que a solidez acate.
Pois se mostrares a ti mesmo tal respeito
logo perceberão. E a contragosto,
ou de bom grado respeitarão também
a tua integridade. E não serás sujeito
a perder o controle por ti imposto,
no decoro e decência que em ti vêem.
SORRINDO PARA MIM
Aquele que mais busca uma atenção
não é quem mais recebe. Existe alguém,
que somente por ser, ganha também
o respeito e a surpresa a cada ação
que material pratica, porque tem
plena consciência de sua projeção
e não se esforça em produzir clarão
mas ilumina ao seu redor, tal quem
possui no próprio olhar magnetismo,
confia em si e espera, no que faz,
sempre fazer melhor quanto possível.
E não se esforça por quebrar o ceticismo,
mas, simplesmente, o seu dever perfaz,
sem lamentar o que é inatingível.
REDATOR
Eu quis poder, da vida a meio e ao longo,
acreditar no que canto e no que prego.
Mas me disponho, feito um tolo cego
a redigir, no compassado gongo
que assinala minha vida, nesse bongo
tão ritmado, em que poemas lego,
o que me vem à mente e nisso entrego,
pedaços de meu ser, nesse regongo,
inútil estrugir de alheias mágoas,
que eu mesmo não as tenho. Indiferente
muitas vezes me percebo ante essas fráguas,
que até parecem de tão fundo me subir...
Mas tão somente escrevo, diligente,
o que em meus dedos se desfaz... a reluzir.