MORTA INFÂNCIA

a Bicudo, Zé Maguin, Jecson e Thiago de Cacique

Tenho saudades do pião jogado,

Com a linha comprada em Maria Gorda,

Na terra firme em frente à casa da adorável Dona Bebé...

Saudosas são as bolinhas-de-gude jogadas por nós,

Meninos inocentes, de buraco em buraco,

Que fosse na rua Marechal, Tenente Victor ou no lazer

Em frente àquele barraco!

A peteca comprada em Seu Manel Coró...

E os patins das meninas cabrocha?

O “danonin” comprado eu seu “Pedin” da Rocha!

O bolo da moça dividido em Chico da Cobal...

Minha infância consumida por minha salgada Macau,

Chão salgado que o meu paladar menino, deixava açucarado!

Na cigarreira do Seu Zé Caial

Comprávamos o confeito, o chocolate e o chiclete...

E na mercearia do Seu Antônio da Barra,

Os pregos para pregar nossos carrinhos de rolimã,

Vulgo “patinéte”...

A bola canarinho comprada no Supermercado Balaio,

Enchia nosso peito com o grito de gol,

Mas quebrava a vidraça

Das casas das senhoras donas de casa

Da nossa humilde e bendita praça.

E os banhos de maré, onde nossas mães

Sequer poderiam saber, se soubessem:

O cinturão fazeria nosso couro arder...

Nós, meninotes inocentes,

Que acordávamos às cinco da manhã

Para depois da tertúlia... a domingueira do chão da praça,

Catarmos os maços de cigarro vazios...

Fazíamos do maço seco, notas perecidas dinheiro,

Dinheiro de mentirinha sendo apostado em nossas brincadeirinhas...

Nós, inocentes meninotes,

Não sabíamos que o cigarro

Que muita gente levou à morte

Fazia nossa alegria

E deixava viva nossa vida!

Nós, inocentemente, aperreávamos os doidos

Que saiam atrás da gente com pedras na mão,

Tinha o biquíni pra burra, formiga matou o elefante,

Mamão Podre e Chico Chicola... perdoe-nos!

Os pastéis de Elione na destruída Camapum,

Esta já foi minha praia!

Os dindins da senhora Dona Dulce!

E o frango assado comprado

À duras penas no Seu Gileno no caminho de volta da praia,

Onde devorávamos como se pobres cachorros famintos fôssemos!

Éramos felizes e sabíamos...

O bom meu caro amigo,

É que além de nós três

Havia outros mais conosco...

Hoje sinto pena do pião,

Bolinhas-de-gude, maços secos de cigarro,

Pastéis, dindins e frango assado...

Hoje sinto pena das crianças

Que foram trancafiadas no pobre quarto adulto,

Alienados pela internet, jogados no inglês, francês e espanhol...

Pobres homens não mais meninos!

A infância foi morta

Com o veneno da velhice dos envenenados adultos.

A maior maturidade de uma criança é viver a infância...

Que seja com descalços sujos pés,

Catarro do nariz descendo

Ou engomadinho nos parques de diversão...

O que importa para uma criança é ter o doce algodão!

Ser salgado amarga o mundo!

E as presepadas?

Quando amigos, quando?

Quando teremos novamente

Um padre furioso correndo atrás de nós,

Pois na casa paroquial,

Escondido dos olhos do padre,

Assistimos filmes de sacanagem

Com as inocentes garotinhas

Que jogamos na vadiagem!

Quando amigos, quando?

Quando roubaremos cana-de-açúcar

Na ilha de Santana, jambos em Alagamar,

Goiabas na quixaba...

Quando pescaremos piabas em Diogo Lopes...

Quando amigos, quando novamente?

Hoje sinto pena da gente,

Somos adultos ricos: pobres adultos!

Pois é,

Não temos mais a infância, mas, tão só,

A doce e ao mesmo tempo amarga lembrança

Que soa alto com a voz da saudade,

Soando forte no peito de uma trágica esperança

No seio da sorte...

Rogando à infância,

O brio de nunca ver a morte!