O Limite da Fé

Toda a precariedade
que parece ser o existir,
além do desejo mórbido
da blasfêmia,
além do desejo de amor e justiça....
Muito além de mim mesmo,
dada minha insuficiência,
e, então, almejar o divino,
almejar a cura das feridas,
e depois temer
que a covardia esteja
a dobrar a alma.
Como entender o santificado,
quando o profano o aniquilou?
Tudo é utilitário,
de um pragmatismo
sem qualquer sentido.
E o tempo passa,
e a escassez de vitalidade física
parece querer se refletir
na criação da miséria na alma.
Como pode-se sonhar quando
o desencanto é mais forte?.
Já não temo por mim,
antes desprezível
para mim mesmo.
Nisto toda ironia
já se faz insuficiente,
e por isso o sarcasmo.
É necessário uma dose
mais forte de vida
para encontrar o espírito,
e nisto pareço estar restrito,
ilógico, perdido de toda razão.
E na razão está
a última trincheira de minha fé.
E crer já não traz consolação,
mas antes o peso do testemunho.
Não duvido da possibilidade
de um bem eterno
além do conhecimento,
mas isso pouco resolve,
pouco ajuda a resolver
a maldição de ser.
Não há como ser livre,
e talvez nem mais deseje ser,
pois que consagro a inutilidade
de tanto desejar, de tanto querer,
se no engano parece, às vezes,
existir mais verdade que no acerto.
E por isso zombo de mim,
zombo do destino,
pois que utilidade tenho para ele,
se não tenho forças para seguir?
De modo que neste combate,
ao me esgotarem as forças,
Acabo por perder o próprio objetivo, 
e assim minha fraqueza foi mais forte. 
Derrotou-me, mas não leva
vitória alguma,
senão, derrotou-se também.
Velho destino de entes guerreiros.
Perdem a batalha, mas não a guerra.
O instituto de destruir
haverá de sempre
causar danos ao adversário.
E o destino não tem sentido sem mim,
e talvez eu não tenha sem ele.
De modo que compartilhamos
a dupla derrota,
brindamos com vinho amargo.
Não existem convivas,
como há muito tempo, somente nós,
somente a solidão.
Antes fosse possível
o alento tolo da efemeridade,
pois a eternidade é um fardo.
Nunca terminar, 
eis uma terrível promessa.
Lamentamos o fim,
mas não existe um fim verdadeiro
para se lamentar, 
são meras ilusões do tempo.
O tempo, talvez nossa maior ilusão.
O jogo humano da criação.
Autores da história,
perdidos dos dias
que abandonam o presente....
E nada, enfim, por dizer,
apenas uma suave depressão,
uma educada tristeza,
pois que é preciso
ter alguma paixão
para sentir a intensidade
da amargura.
Porém, a esta altura aprendi
as virtudes do cinismo.
Já não finjo ser forte, 
apenas tento me iludir
com a indiferença.
E antes que descubra não sê-lo, 
ainda ganho algum tempo,
se é que é possível se ganhar tempo,
essa ilusão quantitativa...
E então concluir
pela necessidade das ilusões.
Tolas, porém menos áridas
que as verdades relativas.
Havia uma rua por onde
não queria andar.
E a rua veio até mim,
fez-me seu cativo,
fingiu me amar. 
E hoje acredito nisso
com todo meu ódio,
pois que não vivo,
senão pela contradição, 
pois que não sou,
senão pelos tolos conflitos do existir.
Gilberto Brandão Marcon
Enviado por Gilberto Brandão Marcon em 15/05/2009
Reeditado em 19/05/2009
Código do texto: T1596350
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