O piloto e o aviãozinho
(São Pedro da Aldeia, RJ, Julho de 1980)
Estava um tanto apressado: o avião ia decolar
e eu estava atrasado.
No corre-corre da pressa
não dei muita atenção ao que pedia meu filho
com um papelzinho na mão:
-Papai, me faz um avião!
-Agora não! Não tenho tempo.
Foi minha resposta, no ato.
-Papai, dobra o papel que o resto eu faço...
insistiu na sua inocência,
sem atinar para a importância da pressa
nem para sua impertinência.
-Agora não! Falei uma vez mais.
Mas, logo percebi o que realmente eu fiz;
vi aquela criança, meu filho,
afastar-se, infeliz, para o seu mundo.
Parei tudo... O abracei e fiz o aviãozinho.
O meu prêmio veio na hora
no seu sorriso de satisfação
e na sua exclamação:-Papai, ele voa!
Na pista, no beijo de despedida,
abracei forte meu filho,
que abraçava seu novo brinquedinho...
-Papai, leva ele pra você! Pra você não me esquecer!
Com o sorriso mais belo
que os seus quatro anos podiam oferecer,
recebi o que me foi ofertado com o maior dos carinhos
para jamais esquecê-lo.
Com um nó na garganta,
na comunicação sem palavras,
deixei as lágrimas correrem...
Foi o maior dos presentes
que jamais recebi, foi o mais belo dos atos
de amor que vivi.
Eligio Moura
40 ANOS MAIS TARDE:
São Pedro da Aldeia,24 de julho de 2020
Para conhecimento deste Esquadrão e devidos fins, torno público o seguinte:
1-ASSUNÇÃO DE CARGO
Assumo na presente data o cargo de Comandante do Primeiro Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque.
2-PALAVRAS INICIAIS
Tive o prazer de viver a Aviação Naval desde os primeiros dias de minha vida. Nasci e cresci cercado pelo cheiro salgado da maresia e pelo assovio do vento que verga a macega. Relembro, com carinho e saudade, dos passeios pela vila nos fins de tarde ao som distante das aeronaves, do cheiro forte de QAV , das lágrimas nas despedidas e dos sorrisos nas revoadas.
Lembro da alegria de acompanhar o meu pai em seus treinamentos de nacele, quando eu, com apenas 12 anos de idade, observava disciplinadamente, enquanto suas mãos firmes e seguras passeavam ágeis pela cabine dos nossos saudosos helicópteros SH3A. No universo inocente daquela criança, repleto de sonhos maravilhosos e cheios de encantamento, aquele momento tornou-se eterno e passou a fazer parte da minha essência!
Deus traçou os meus caminhos, me abençoou e tornou meu sonho de criança realidade. O destino me concedeu a dádiva de retornar a São Pedro da Aldeia e poder reviver as minhas origens.
Há 17 anos cruzei pela primeira vez o portaló do Esquadrão VF-1, desta vez como Oficial de Marinha, Aviador Naval e piloto de caça. Nesta casa construí verdadeiras amizades. Estabeleci laços invioláveis de sangue, cresci profissionalmente, encontrei disciplina, lealdade, honra, sacrifício e sobretudo muita coragem e amor á Marinha e ao Brasil. Por certo que o caminho não foi fácil, mas os desafios e as emoções desta jornada foram o combustível que revigoravam a minha alma a cada dia.
Afirmo que chego hoje, orgulhoso, ao ápice de minha trajetória profissional, sonho daquele menino que outrora brincava na Macega e de todos os jovens tenentes que passam por estes portões e ostentam a bolacha do “Falcão” no uniforme e no coração.
Neste momento, ciente da imensa responsabilidade a mim a atribuída, e tomado por um sentimento profundo de alegria e gratidão, não poderia me furtar de render alguns agradecimentos:
-a Deus, pela dádiva da vida;
-ao meu irmão, compartilho hoje contigo a alegria que viveu 6 meses atrás, ao assumir o comando do Grupamento dos Mergulhadores de Combate, agradeço pela parceria incondicional, pelo amor fraterno e por toda a confiança que sempre depositou em mim;
-à minha amada mãe, agradeço todo o amor, carinho e zelo, e por doar a sua vida integralmente aos seus três marinheiros. A sua generosidade é contagiante. Eu te amo!
-ao meu pai, Aviador Naval, homem mais íntegro e corajoso que já conheci. Hoje vemos com clareza que os desígnios de Deus são mais importantes do que o desejo do homem e o seu legado está escrito. Aos quatro anos de idade, como prova legítima de amor, te presenteei com um pequeno avião de papel que guardas com carinho até os dias de hoje. Há tempos os meus aviões não são mais de papel, mas o meu amor por você permanece o mesmo, puro e genuíno. À você dedico este momento tão especial, e não se preocupe, meu amado pai, você pode não ter mais as mãos ágeis que passeava pela cabine dos nossos bravos SH3A, mas elas continuarão sempre firmes e seguras a guiar o meu caminho;
-à minha esposa Flávia, agradeço por ser o meu equilíbrio e a minha paz, pelo apoio incondicional e pela maravilhosa família que me proporcionou. Agradeço, sobretudo, por ter escolhido trilhar comigo os meus caminhos, tornando-os seus, mesmo ao pesado custo de conviver diariamente com a dor da saudade. Você é a minha alegria de viver.
-ao meu filho Luís Fernando, presente maior que Deus poderia me dar, agradeço o amor, os carinhos, as cartas, os abraços apertados e as estórias para dormir. Na sua inocência de criança você foi o meu grande professor, amigo e confidente;
-às minhas filhas, Amanda e Juliana, agradeço o carinho e o afeto com que me receberam em suas vidas, e pela energia radiante que ilumina o nosso lar. Vocês são as peças que completam o nosso maravilhoso mosaico.
Gostaria agora de dirigir-me à minha tripulação, marinheiros e fuzileiros, corajosos combatentes, a quem admiro e tenho profundo respeito.
Temos a imensa responsabilidade de manter o nosso Esquadrão e operar as nossas aeronaves de forma segura e eficiente, de honrar aqueles que nos antecederam e de entregar à Esquadra e à Marinha do Brasil um vetor de combate à altura do nome que carregamos.
Mais do que isso, o nosso esquadrão simboliza a concretização de um sonho vivido por muitas gerações de marinheiros, oficiais e praças que aspiravam ver a Aviação Naval munida de aeronaves de alta performance, e é nosso dever alimentar a cultura da aviação de caça embarcada e mostrar a nossa grandeza, mantendo sólidos os nossos alicerces. Eu não poderia ter uma equipe melhor para esta tarefa!
Tenho em cada um de vocês mais do que profissionais extremamente capacitados ou militares com e elevados conceitos éticos e morais. Vejo dentro de cada um, o sentimento inexplicável que só quem passou por estes portões é capaz de compreender. A mística da Aviação de Caça, a crença inabalável no impossível, o magnífico entusiasmo de ”pertencer” ou de “ fazer parte”, a magia que desvia o nosso olhar para o céu, sempre que ouvimos o bramido singular de nossos motores. É impossível passar incólume pelo VF-1, e é esse sentimento que nos moverá a cada dia.
Sei que o caminho não será fácil, mas confio plenamente nos Falcões e convido-os a enfrentar comigo os desafios que certamente virão.
Ofereço-lhes a minha total dedicação, lealdade e respeito, e reitero o meu dever de entregar aos senhores um ambiente de trabalho saudável e as ferramentas necessárias para a manutenção de sua capacitação profissional. Peço, entretanto, que jamais deixem de cultivar os nossos valores e de alimentar o entusiasmo em seus corações.
Estarei sempre com vocês! Contem comigo!
Eduardo Luís Guimarães de Moura
Capitão de Fragata
Comandante
(São Pedro da Aldeia, RJ, Julho de 1980)
Estava um tanto apressado: o avião ia decolar
e eu estava atrasado.
No corre-corre da pressa
não dei muita atenção ao que pedia meu filho
com um papelzinho na mão:
-Papai, me faz um avião!
-Agora não! Não tenho tempo.
Foi minha resposta, no ato.
-Papai, dobra o papel que o resto eu faço...
insistiu na sua inocência,
sem atinar para a importância da pressa
nem para sua impertinência.
-Agora não! Falei uma vez mais.
Mas, logo percebi o que realmente eu fiz;
vi aquela criança, meu filho,
afastar-se, infeliz, para o seu mundo.
Parei tudo... O abracei e fiz o aviãozinho.
O meu prêmio veio na hora
no seu sorriso de satisfação
e na sua exclamação:-Papai, ele voa!
Na pista, no beijo de despedida,
abracei forte meu filho,
que abraçava seu novo brinquedinho...
-Papai, leva ele pra você! Pra você não me esquecer!
Com o sorriso mais belo
que os seus quatro anos podiam oferecer,
recebi o que me foi ofertado com o maior dos carinhos
para jamais esquecê-lo.
Com um nó na garganta,
na comunicação sem palavras,
deixei as lágrimas correrem...
Foi o maior dos presentes
que jamais recebi, foi o mais belo dos atos
de amor que vivi.
Eligio Moura
40 ANOS MAIS TARDE:
São Pedro da Aldeia,24 de julho de 2020
Para conhecimento deste Esquadrão e devidos fins, torno público o seguinte:
1-ASSUNÇÃO DE CARGO
Assumo na presente data o cargo de Comandante do Primeiro Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque.
2-PALAVRAS INICIAIS
Tive o prazer de viver a Aviação Naval desde os primeiros dias de minha vida. Nasci e cresci cercado pelo cheiro salgado da maresia e pelo assovio do vento que verga a macega. Relembro, com carinho e saudade, dos passeios pela vila nos fins de tarde ao som distante das aeronaves, do cheiro forte de QAV , das lágrimas nas despedidas e dos sorrisos nas revoadas.
Lembro da alegria de acompanhar o meu pai em seus treinamentos de nacele, quando eu, com apenas 12 anos de idade, observava disciplinadamente, enquanto suas mãos firmes e seguras passeavam ágeis pela cabine dos nossos saudosos helicópteros SH3A. No universo inocente daquela criança, repleto de sonhos maravilhosos e cheios de encantamento, aquele momento tornou-se eterno e passou a fazer parte da minha essência!
Deus traçou os meus caminhos, me abençoou e tornou meu sonho de criança realidade. O destino me concedeu a dádiva de retornar a São Pedro da Aldeia e poder reviver as minhas origens.
Há 17 anos cruzei pela primeira vez o portaló do Esquadrão VF-1, desta vez como Oficial de Marinha, Aviador Naval e piloto de caça. Nesta casa construí verdadeiras amizades. Estabeleci laços invioláveis de sangue, cresci profissionalmente, encontrei disciplina, lealdade, honra, sacrifício e sobretudo muita coragem e amor á Marinha e ao Brasil. Por certo que o caminho não foi fácil, mas os desafios e as emoções desta jornada foram o combustível que revigoravam a minha alma a cada dia.
Afirmo que chego hoje, orgulhoso, ao ápice de minha trajetória profissional, sonho daquele menino que outrora brincava na Macega e de todos os jovens tenentes que passam por estes portões e ostentam a bolacha do “Falcão” no uniforme e no coração.
Neste momento, ciente da imensa responsabilidade a mim a atribuída, e tomado por um sentimento profundo de alegria e gratidão, não poderia me furtar de render alguns agradecimentos:
-a Deus, pela dádiva da vida;
-ao meu irmão, compartilho hoje contigo a alegria que viveu 6 meses atrás, ao assumir o comando do Grupamento dos Mergulhadores de Combate, agradeço pela parceria incondicional, pelo amor fraterno e por toda a confiança que sempre depositou em mim;
-à minha amada mãe, agradeço todo o amor, carinho e zelo, e por doar a sua vida integralmente aos seus três marinheiros. A sua generosidade é contagiante. Eu te amo!
-ao meu pai, Aviador Naval, homem mais íntegro e corajoso que já conheci. Hoje vemos com clareza que os desígnios de Deus são mais importantes do que o desejo do homem e o seu legado está escrito. Aos quatro anos de idade, como prova legítima de amor, te presenteei com um pequeno avião de papel que guardas com carinho até os dias de hoje. Há tempos os meus aviões não são mais de papel, mas o meu amor por você permanece o mesmo, puro e genuíno. À você dedico este momento tão especial, e não se preocupe, meu amado pai, você pode não ter mais as mãos ágeis que passeava pela cabine dos nossos bravos SH3A, mas elas continuarão sempre firmes e seguras a guiar o meu caminho;
-à minha esposa Flávia, agradeço por ser o meu equilíbrio e a minha paz, pelo apoio incondicional e pela maravilhosa família que me proporcionou. Agradeço, sobretudo, por ter escolhido trilhar comigo os meus caminhos, tornando-os seus, mesmo ao pesado custo de conviver diariamente com a dor da saudade. Você é a minha alegria de viver.
-ao meu filho Luís Fernando, presente maior que Deus poderia me dar, agradeço o amor, os carinhos, as cartas, os abraços apertados e as estórias para dormir. Na sua inocência de criança você foi o meu grande professor, amigo e confidente;
-às minhas filhas, Amanda e Juliana, agradeço o carinho e o afeto com que me receberam em suas vidas, e pela energia radiante que ilumina o nosso lar. Vocês são as peças que completam o nosso maravilhoso mosaico.
Gostaria agora de dirigir-me à minha tripulação, marinheiros e fuzileiros, corajosos combatentes, a quem admiro e tenho profundo respeito.
Temos a imensa responsabilidade de manter o nosso Esquadrão e operar as nossas aeronaves de forma segura e eficiente, de honrar aqueles que nos antecederam e de entregar à Esquadra e à Marinha do Brasil um vetor de combate à altura do nome que carregamos.
Mais do que isso, o nosso esquadrão simboliza a concretização de um sonho vivido por muitas gerações de marinheiros, oficiais e praças que aspiravam ver a Aviação Naval munida de aeronaves de alta performance, e é nosso dever alimentar a cultura da aviação de caça embarcada e mostrar a nossa grandeza, mantendo sólidos os nossos alicerces. Eu não poderia ter uma equipe melhor para esta tarefa!
Tenho em cada um de vocês mais do que profissionais extremamente capacitados ou militares com e elevados conceitos éticos e morais. Vejo dentro de cada um, o sentimento inexplicável que só quem passou por estes portões é capaz de compreender. A mística da Aviação de Caça, a crença inabalável no impossível, o magnífico entusiasmo de ”pertencer” ou de “ fazer parte”, a magia que desvia o nosso olhar para o céu, sempre que ouvimos o bramido singular de nossos motores. É impossível passar incólume pelo VF-1, e é esse sentimento que nos moverá a cada dia.
Sei que o caminho não será fácil, mas confio plenamente nos Falcões e convido-os a enfrentar comigo os desafios que certamente virão.
Ofereço-lhes a minha total dedicação, lealdade e respeito, e reitero o meu dever de entregar aos senhores um ambiente de trabalho saudável e as ferramentas necessárias para a manutenção de sua capacitação profissional. Peço, entretanto, que jamais deixem de cultivar os nossos valores e de alimentar o entusiasmo em seus corações.
Estarei sempre com vocês! Contem comigo!
Eduardo Luís Guimarães de Moura
Capitão de Fragata
Comandante